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Uma Visão Econômica da Mudança Climática

A pesquisa científica revela a ocorrência de consideráveis flutuações de temperatura durante 100.000 anos, alternando-se fases de intenso calor e frio. Nos últimos sete mil anos houve, contudo, notável estabilidade, o que teria contribuído para viabilizar o desenvolvimento de nossa civilização. Já entre 1900 e 2010 a temperatura média da Terra se elevou em 0,8 graus centígrados. 

Enquanto as mudanças climáticas passadas teriam sido causadas por fenômenos naturais, a mudança recente está sendo crescentemente provocada pelo homem. 

A concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera passou de 280 partes por milhão (ppm) em 1750 para 390 ppm nos dias de hoje. Se nada for feito para conter a escalada, os modelos projetam de 700 a 900 ppm para o final deste século, o que resultaria em elevação da temperatura média na Terra em 3 a 5 graus centigrados. Refletindo o grau de incerteza existente, estimativas apontam perdas que variam de 1 a 10% do PIB global em 2100 – cerca de US$ 870 bilhões a US$ 8,7 trilhões a valores atuais. 

A fonte primordial da mudança climática ou aquecimento global é a queima de combustíveis fosseis, baseados em carbono, que conduz à emissão de CO, responsável por 77% dos gases de efeito estufa (GEEs). Estes se acumulam na atmosfera e devido à lenta absorção, lá permanecem por muitos anos. 

O aquecimento global é provocado pelo estoque acumulado de GEEs e não pelos fluxos correntes de emissões. Enquanto os países desenvolvidos produziram no passado 80% dos gases acumulados, hoje a maior parte das emissões vem de economias emergentes, que muito provavelmente serão responsáveis por parcelas crescentes no futuro. 

O aumento da concentração de GEEs na atmosfera leva ao aquecimento da terra e dos mares. Tais efeitos acabam se retroalimentando na atmosfera, oceanos, geleiras e sistemas biológicos. Em última instância, o consenso é que profundos impactos nas atividades biológicas e humanas sensíveis ao clima podem vir a se manifestar no longo prazo. 

O problema do aquecimento global não deve ser dramatizado, nem tampouco tratado com barreiras ao investimento e crescimento econômico. A mudança climática começa e termina com as atividades do ser humano. A concepção de políticas eficientes para mitigá-la está nas ciências sociais, dependendo essencialmente da boa compreensão de seus aspectos econômicos e do papel dos mercados. 

Fundamentalmente, o aquecimento global tem origem no problema que os economistas batizaram de externalidade: os emissores de GEEs não pagam pelos custos ambientais gerados, que acabam sendo compartilhados pelo resto do mundo. Isto surge porque um recurso – o meio ambiente – não é precificado e consequentemente usado em excesso. 

A prescrição é estabelecer um imposto sobre a emissão de carbono que iguale os benefícios de emissões adicionais, que ocorrem no presente, aos seus custos, que se manifestam ao longo do tempo. 

A solução está sendo implementada em vários países através de dois instrumentos principais: a taxação do carbono e as chamadas cap-and-trade policies. Estas compreendem a fixação de limites para emissões e permissões para quem os excedeu comprá-los de quem emitiu menos. 

Outras iniciativas incluem padrões de eficiência energética para veículos, prédios e instalações industriais, subsídios para o desenvolvimento de fontes de energia renovável e incentivos para o reflorestamento. 

A simplicidade conceitual mascara a complexidade da solução. O desenho e a implementação de políticas de mitigação do aquecimento global enfrenta muitos desafios e questões ainda não resolvidas. 

Como convencer as gerações presentes em investir recursos que beneficiarão majoritariamente gerações futuras? Como descontar os fluxos de retornos futuros para compará-los com os custos dos investimentos? Como a incerteza a respeito da magnitude de danos ambientais futuros afeta as estratégias hoje adotadas? Como estimular a pesquisa e o ritmo de progresso tecnológico em fontes energéticas alternativas? 

A cooperação internacional é muito relevante pois estamos tratando de uma externalidade global, já que em termos de impacto sobre o meio ambiente tanto faz uma tonelada de carbono emitida no Brasil quanto na Índia. O fato de que o custo da redução das emissões é incorrido totalmente pelo país que investe e os retornos são compartilhados com o resto do mundo dificulta a coordenação entre nações . 

Outro elemento complicador reside no que os economistas chamam de incentivos para o free rider: os benefícios do consumo de combustíveis fosseis são imediatos e concentrados enquanto que os custos sociais tendem a se manifestar num futuro distante e são amplamente dispersos. Todo mundo gosta de uma carona de graça. 

Os custos sociais do aquecimento global e os benefícios de sua mitigação não são uniformes, o que leva a diferentes percepções entre países sobre o valor dos investimentos necessários. 

Políticas de mitigação oferecem combinações de risco-retorno para economias emergentes – cuja prioridade número um é compreensivelmente o crescimento da renda – distintas daquelas para países desenvolvidos. Em consequência, a emissão de GEEs por dólar de PIB na União Européia e EUA é bem inferior às dos BRICs, sendo o Brasil o mais bem comportado neste grupo de emergentes. 

A costumeira adoção por governos de economias emergentes – entre eles o do Brasil – de subsídios aos preços de derivados de petróleo, como a gasolina, para maximizar ganhos políticos de curto prazo têm entre outras contrapartidas negativas o estímulo direto à emissão de CO2, ao baratear artificialmente o preço de um combustível fóssil. Isso evidencia também quão maléfica pode ser a intervenção estatal na questão ambiental. 

Estima-se que entre 1900 e 2010 as emissões globais de carbono se expandiram à taxa média anual de 2,6%. Dado que a economia global cresceu à taxa média de 3,7% ao ano, houve redução da quantidade de CO2 por dólar de PIB ao ritmo de 1,1% ao ano, fenômeno conhecido como descarbonização. 

A rápida expansão de economias emergentes e a crescente demanda por energia daí decorrente concorrem para o aquecimento global. Por outro lado, o aumento da renda e da riqueza nessas economias tende a elevar o valor atribuído à proteção ao meio ambiente. Isso se reflete na modificação da posição da China traduzida recentemente na priorização do combate à poluição ambiental e o uso mais intensivo de energia eólica e solar. 

As mudanças estruturais associadas à dinâmica do crescimento econômico elevam a participação na atividade econômica de setores menos intensivos em energia – como a tecnologia da informação e de serviços como saúde, educação, e finanças – relativamente à indústria manufatureira tradicional, se apresentando como fonte relevante de descarbonização. 

A dinâmica do crescimento econômico está associada à realização contínua de ganhos de eficiência que implicam no uso de menor quantidade de energia por unidade de produto. 

Finalmente, a descarbonização é provocada por mudanças nas fontes de energia para combustíveis menos intensivos em carbono, como o gás natural, e fontes renováveis e não fosseis (hidráulica, nuclear, eólica, solar, biomassa, geotérmica). 

No âmbito corporativo, o desafio é conciliar investimentos em projetos que reduzam emissões de GEEs com o objetivo de maximização de lucros para os acionistas. Um caso de sucesso é o processamento a seco do minério de ferro, que diminui simultaneamente custos de investimento e operacionais e a emissão de carbono. 

A precificação do carbono é a solução de mercado para induzir mudanças substantivas na matriz energética global. O homem reage a incentivos e os avanços na tecnologia têm produzido feitos extraordinários nos últimos 150 anos. O bom uso do instrumental de teoria econômica proporcionará a criação dos estímulos capazes de gerar respostas efetivas ao aquecimento global.

Por: Roberto Castello Branco (Plurale).

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