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Desastres Climáticos Aumentam Risco de Conflito Armado Entre Grupos Étnicos

Cidade de Kobanî (ou o que sobrou dela), na Síria.

Muito já se ouviu falar dos desastres naturais que acabaram com civilizações inteiras no passado da humanidade, como se acredita ter influenciado a queda da Civilização Maia, por exemplo. No entanto, não são os eventos climáticos em si, mas a vulnerabilidade às suas consequências juntamente com outros fatores que levam à desintegração social, conflitos armados e até o colapso de sociedades tanto no período pré-histórico quanto recentemente. 

Um estudo publicado na revista PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences) revelou que, embora não haja uma evidência de que os desastres climáticos provoquem diretamente conflitos armados, eles têm um papel trágico para o início dessas guerras principalmente em sociedades divididas etnicamente. 

No mundo inteiro, Carl-Friedrich Schleussner e colegas do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto do Clima, na Alemanha encontraram uma taxa de correlação de 9% entre conflitos e desastres como ondas de calor ou seca, etc. A pesquisa [Armed-Conflict Risks Enhanced by Climate-Related Disasters in Ethnically Fractionalized Countries] também revela que cerca de 23% dos conflitos armados entre 1980 e 2000 em países com muitas diferenças étnicas coincidem com calamidades climáticas. 

Análises recentes das consequências de secas na Síria e na Somália indicam que os eventos climáticos já contribuíram para o conflito armado ou guerra civil em ambos países. Seca prolongada também contribuiu negativamente para os conflitos que continuam acontecendo no Afeganistão. No Iraque e na Síria, por exemplo, as divisões étnicas são acentuadas. 

Essa observação tem implicações importantes para políticas de segurança nas regiões mais propensas a conflito, como norte da África, África Central e Ásia Central - áreas vulneráveis tanto à ação humana sobre o clima quanto marcadas por divisões étnicas. Nos conflitos em geral, a relação com o clima não é direta, mas age como fator desestabilizador em regiões já propensas ao conflito por terem tensões sociais. 

Hipótese das mudanças climáticas ganha força 

Muitos fatores de risco que têm o potencial de gerar um conflito já foram identificados, como pobreza, desigualdade de renda, governança fraca ou conflitos históricos pré-existentes. Hipóteses como ligação com ativos financeiros ligados à explosão de recursos naturais também têm sido discutidas. No entanto, vem crescendo o número de trabalhos que indicam que a divisão étnica é um dos fatores-chave para determinar o risco de conflito armado em uma sociedade. 

Embora não tenham exatamente raízes em tensões étnicas, cerca de dois terços de todas as guerras civis desde 1946 tiveram algum componente étnico. O papel proeminente da etnia nos conflitos pode estar relacionado ao acesso seletivo ao poder político ou a recursos que frequentemente são divididos seguindo a etnia, assim como o potencial rápido de mobilização étnica que emerge da concentração geográfica de grupos e dos laços sociais fortes entre pessoas da mesma etnia. 

Esses dois fatores podem contribuir para fraturas sociais em fronteiras étnicas em caso de tensão social rápida gerada por eventos como desastres naturais. Além disso, parece que os grupos étnicos podem ser impactados de maneira bastante diferente por desastres naturais. 

A concentração geográfica pode ser reforçada por outros fatores como modos de vida específicos como os de comunidades ribeirinhas e pastoris ou discriminação socioeconômica que os faz mais vulneráveis a desastres. 

Na pesquisa, são especificados os impactos dos desastres em termos de prejuízo econômico ao Produto Interno Bruto (PIB), usando uma base de dados de alta qualidade desenvolvida para propósitos comerciais do setor de resseguros. Para testar as correlações estatísticas entre eventos climáticos e o momento dos conflitos armados, foi usado um método chamado análise de coincidência de eventos, conceitualmente relacionado à sincronização de eventos e abordagens parecidas que são usadas em neurociência.

Por: Paula Moura (UOL Notícias).

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