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Agrotóxicos: 17 Tipos de Venenos São Encontrados em Parques Nacionais


Nos parques nacionais de Itatiaia e da Serra dos Órgãos, situados a mais de 2 mil metros de altitude, foram encontradas concentrações de agrotóxicos banidos ou acima do permitido pela União Europeia. 

Desta vez, os agrotóxicos foram, literalmente, longe demais. Um estudo inédito publicado em março de 2025 na revista científica Environmental Pollution encontrou um combo de 17 tipos diferentes de veneno a mais de 2 mil metros de altitude, nos parques nacionais Itatiaia e Serra dos Órgãos, no Rio de Janeiro. Esses campos, que ficam a quilômetros de distância dos monocultivos do agronegócio, são unidades de conservação de proteção integral. 

Consideradas até então intocadas, essas áreas são vítimas do efeito deriva. Os achados da pesquisa refletem a necessidade urgente de compreender a magnitude deste fenômeno, responsável por transportar os agrotóxicos, por meio das correntes de ar ou das águas subterrâneas, para locais distantes de onde foram aplicados. 

As áreas de contaminação identificadas pela pesquisa estão localizadas acima dos dois mil metros de altitude — um patamar difícil de visualizar no cotidiano. Para efeito de comparação, o Cristo Redentor está a 710 metros acima do nível do mar, enquanto o Pão de Açúcar alcança 396 metros. Ou seja, a presença de agrotóxicos foi detectada em regiões quase três vezes mais elevadas que o principal cartão-postal da capital fluminense. Um ambiente onde a presença humana já é limitada pela natureza, mas onde o impacto químico da atividade agrícola conseguiu chegar. 

A partir da análise de três amostras de sedimentos de cada unidade de conservação foram encontrados, no total, seis herbicidas, sete inseticidas, quatro fungicidas e dois acaricidas. Tiveram destaque nas análises o clorpirifós, diazinon e dissulfoton, inseticidas do grupo dos organofosforados. 

O clorpirifós, além de ter sido o mais abundante em quatro das seis amostras, foi encontrado em concentração 14.589 vezes acima do nível considerado seguro para organismos aquáticos, como microcrustáceos, algas e peixes. O diazinon, embora detectado em menor quantidade, apresentou níveis até 778 vezes superiores ao limite aceitável. Já o dissulfoton apareceu em concentrações até 347 vezes acima do que é considerado seguro para o meio ambiente. 

Cláudio Parente, pesquisador em ecotoxicologia e contaminação ambiental e professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), frisa dois aspectos surpreendentes do estudo: a capacidade de locomoção das moléculas e sua persistência no ambiente. 

Para ele, “esses sedimentos, além de estarem distantes, possuem matéria orgânica, microrganismos, então, esperava-se que eles [os microrganismos] fizessem biodegradação desses compostos. Mas não. Além de encontrarmos concentrações significativas, nos deparamos com um coquetel de agrotóxicos”. 

A descoberta nos parques nacionais brasileiros é feita seis décadas depois dos primeiros alertas sobre os riscos do uso de agrotóxicos. Em 1962, a escritora Rachel Carson publicou o livro Primavera Silenciosa, que denunciou, entre outros problemas, a persistência ambiental de substâncias como o DDT, um inseticida de forte aderência à água. 

A obra foi um dos marcos de fundação do movimento ambientalista e motivou o surgimento de uma mobilização global para substituir esses compostos. No Brasil, o uso do DDT foi banido na agricultura em 1985 e no controle de doenças em 2009. 

Desde então, surgiram novas moléculas consideradas menos persistentes no ambiente, embora seu uso contínuo ainda represente sérios riscos ecológicos. “O problema é que, como elas estão sempre sendo lançadas no ambiente, a ocorrência delas é permanente. É o que chamamos de substâncias pseudopersistentes”, define Parente. Essa expressão, pseudopersistentes, significa que, mesmo tendo uma vida curta, os agrotóxicos estão sempre presentes no ambiente por conta do uso contínuo. Essa forte aderência tem relação com a frequência e a intensidade de aplicação, e não com alguma característica de sua composição química. 

O estudo de Parente reforça um alerta que há anos sensibiliza movimentos sociais e pesquisadores. “Não tem mais regiões protegidas dos agrotóxicos no país”, resume a pesquisadora e integrante da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, Karen Friedrich. Na visão dela, a presença de pesticidas em parques nacionais localizados a mais de dois mil metros de altitude é a prova mais clara de que a contaminação se tornou sistêmica e invisível, atravessando fronteiras ambientais e sociais. 

“Se em lugares considerados intocados há agrotóxicos, imagine nas regiões onde a exposição é constante e frequente”, adverte Karen. Em territórios agrícolas, onde a pulverização é intensa e cotidiana, os riscos à saúde humana e à biodiversidade se multiplicam, mas a fiscalização ainda é frágil e a vigilância sanitária permanece muito aquém da dimensão real do problema. 

Espécies endêmicas em risco 


O Parque Nacional do Itatiaia, criado em 1937, é o primeiro do Brasil. É uma unidade de conservação de proteção integral, ou seja, bastante restritiva, e teve a sua extensão ampliada, em 1982, de 11.943 para 28.086 hectares. Ele abrange parte do território dos municípios de Itatiaia e Resende, no Rio de Janeiro, e Itamonte e Bocaina de Minas, em Minas Gerais. 

A sua fisionomia é semelhante à dos Andes, situada no Chile, tanto em relação às áreas montanhosas, quanto à presença de grande biodiversidade. O local abriga diversas espécies endêmicas — que só estão presentes em determinada região — de fauna e flora, a exemplo do sapo flamenguinho. Símbolo da biodiversidade da Mata Atlântica, esse anfíbio de dorso preto e barriga vermelha contribui para a cadeia alimentar ao controlar insetos e possui propriedades medicinais nas suas toxinas. 


Criado em 30 de novembro de 1939, o Parque Nacional da Serra dos Órgãos (Parnaso), terceiro mais antigo do país, é uma unidade de conservação destinada a proteger os ecossistemas e a rara biodiversidade da Serra do Mar. Possui 20.024 hectares distribuídos nos municípios serranos de Teresópolis, Petrópolis, Magé e Guapimirim. É importante destacar que algumas das espécies endêmicas desta região sequer foram identificadas. 

Coautor do estudo, o pesquisador e professor adjunto da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Rodrigo Ornellas Meires alerta sobre a toxicidade do clorpirifós. Ele reforça que, à primeira vista, o produto pode não “matar os insetos nessas concentrações ambientais, mas pode causar desorientação”. O problema é que, ao longo de anos, a exposição desses insetos aos agrotóxicos é bioacumulativa, o que significa dizer que as substâncias vão aumentando nos organismos e podem levar à extinção. 

Um estudo publicado na revista Environmental Science and Pollution Research revelou que o clorpirifós afeta a capacidade de locomoção de uma larva muito comum em regiões de alta montanha. A substância provoca forte estresse nesses insetos, fazendo com que eles precisem gastar toda a energia tentando combater o mal-estar. Assim, a sua capacidade de deslocamento fica comprometida. 

Outro levantamento, publicado no International Journal of Environmental Research and Public Health, indica que esse inseticida pode influenciar alterações na população de fungos, bactérias e actinomicetos no solo e inibir a mineralização de nitrogênio. Segundo o documento, apenas 1% do clorpirifós aplicado atinge a planta-alvo: o restante penetra no solo. A pesquisa também destaca que esse agrotóxico é facilmente solúvel na água. 

Luiz Cláudio Meirelles, pesquisador em Saúde Pública do Centro de Estudos em Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, afirma que as análises de contaminação da vigilância ambiental são pontuais. “Na área ambiental, eu desconheço programas em âmbito nacional que estejam acontecendo. O que você vai encontrar é o que vimos agora: uma pesquisa da UFRJ, que investiga lá por um período e pronto. O ideal é que se fizesse um monitoramento contínuo, já que esta é a única maneira de fazer o enfrentamento com as empresas que atuam nesse campo”, pondera. 

“Visivelmente ninguém adoece de repente, a não ser aquele agricultor que recebeu uma carga, uma dose alta de veneno num determinado momento da aplicação, mas a gente está preocupado com a questão crônica.” Em resumo, os efeitos a longo prazo são ignorados. 

Para se ter uma ideia, o incentivo ao uso de agrotóxicos no Brasil iniciou na década de 60 e ganhou ênfase nos anos 70, no embalo da “Revolução Verde”. Contudo, apenas em 2012 foi criada a Política Nacional de Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Agrotóxicos (PNVSPA). Essa iniciativa tem o objetivo de proteger as populações dos riscos e danos provocados pelos agrotóxicos. Esse descompasso, representado por esse hiato de mais de meio século, perdura. 

O serviço de Vigilância no Brasil hoje se divide em três: sanitária, ambiental e saúde do trabalhador. Cabe à vigilância ambiental monitorar e avaliar o impacto do meio ambiente à saúde, aferindo, por exemplo, a qualidade do ar e da água, e os efeitos de queimadas e mudanças climáticas. Suas atuações, segundo fontes ouvidas pela reportagem, são tímidas e não acompanham o ritmo de liberação de pesticidas. 

Embora a administração das unidades de conservação federais, como os parques nacionais de Itatiaia e da Serra dos Órgãos, seja responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), a fiscalização e o controle do uso de agrotóxicos são compartilhados entre três órgãos federais: o Ibama, o Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) e a Anvisa. 

Cada um desses órgãos atua sobre um eixo específico: o Ibama é responsável pelos impactos ambientais, o MAPA supervisiona o uso agronômico e a Anvisa avalia os riscos à saúde humana. Apesar dessa divisão, a presença de pesticidas em áreas de preservação mostra que, na prática, os mecanismos de controle são insuficientes para impedir que essas substâncias atinjam ecossistemas que deveriam estar protegidos. 

Durante a apuração desta reportagem, todos os órgãos foram procurados. Mas o que se evidenciou foi uma espécie de jogo de empurra. O Ibama encaminhou o questionamento ao ICMBio; e a Anvisa, por sua vez, sugeriu consulta ao Ibama e ao Ministério da Saúde. Em comum, as respostas mostram que a vigilância ambiental sobre a presença de agrotóxicos em áreas protegidas é um tema sem resposta clara — embora as próprias fontes científicas ouvidas pela reportagem alertem para a gravidade do problema. 

O que fica evidente é que a maneira como os agrotóxicos são aprovados no Brasil — a toque de caixa — e a ausência de reavaliações periódicas com base em novos estudos internacionais ampliam ainda mais a vulnerabilidade ambiental e sanitária. Como explicou o pesquisador Cláudio Parente, muitos pesticidas são liberados sem que existam avaliações suficientes sobre seus impactos ecológicos e toxicológicos. 

Posteriormente, novos estudos, especialmente na União Europeia, demonstram a periculosidade dessas substâncias, levando ao seu banimento — algo que não encontra eco no processo regulatório brasileiro. Mesmo quando reavaliações são feitas, opta-se frequentemente por manter o registro desses compostos. A contaminação de áreas consideradas intocadas apenas escancara as consequências dessa política permissiva. 

Raio-X do Clorpirifós 

O clorpirifós é um pesticida muito utilizado. Em 2023, foram comercializadas 6.442 toneladas deste produto no Brasil — mesmo banido em 2020 da Europa e, no ano seguinte, dos Estados Unidos. Nunca é demais destacar que esse último país ostentava até 2007 o posto que, hoje, pertence ao Brasil: maior consumidor de agrotóxicos do mundo. 

Há 24 produtos contendo clorpirifós com uso autorizado no Brasil. Segundo as Monografias autorizadas da Anvisa, o seu uso é comum em cultivos como algodão, amendoim, ervilha, feijão, lentilha, milho, entre outros. Um conjunto de evidências científicas aponta que a exposição humana ao clorpirifós pode estar associada a câncer no cérebro, câncer colorretal, leucemia, sarcoma de tecidos moles, câncer de pulmão, mal de Alzheimer, mal de Parkinson, asma, respiração com ruído, infertilidade, malformações congênitas, disfunções sexuais, desordem do déficit de atenção e hiperatividade, autismo, atrasos no desenvolvimento, intoxicações agudas severas e neurotoxicidade. 

Foram justamente esses estudos que levaram ao banimento em países do Norte. Aqui, em 2021, a Anvisa lançou um edital para revisão do clorpirifós, mas o produto segue sendo utilizado. Claudio Parente frisa que o “Brasil deveria ter um sistema regulatório [de agrotóxicos] mais conservador” – em outras palavras, produtos aprovados há muito tempo, mas banidos na Europa com base em novos estudos, deveriam ser reavaliados com rigor. 

Na contramão do que anseia Parente, a aprovação de agrotóxicos no Brasil segue galopante. As flexibilizações adotadas durante o governo Bolsonaro, que levaram à aprovação recorde de 2.182 substâncias, quase 2,5 produtos por dia, no período entre 2019 e 2022, foram mantidas e turbinadas com a aprovação do PL 1459, o famigerado PL do Veneno. 

Segundo Karen Friedrich, da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, a aprovação “alucinada” de produtos tem base em resoluções infralegais instituídas durante a gestão anterior. “A liberação comercial que se sustenta no governo Lula é resultado daquelas aprovações do governo anterior, mas também do fato de o atual não ter enfrentado e derrubado essas normativas”, afirma. 

Friedrich lembra que muitas dessas resoluções, editadas por Anvisa e MAPA, continuam vigentes e dão respaldo jurídico à liberação de substâncias com alto potencial tóxico. “Hoje é possível registrar produtos mais tóxicos do que a gente já tem registrado, quer dizer, abre-se o mercado brasileiro para produtos com maior potencial cancerígeno, por exemplo”, alerta. 

Em 2023, foram aprovados 557 novos produtos agrotóxicos no Brasil. Em 2024, o número subiu para 664. Em 46% dessas novas autorizações, há pelo menos um ingrediente ativo já banido na União Europeia. A doutora em Ciências e professora aposentada da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Sônia Hess, explica que todo esse agrotóxico aprovado em ritmo frenético é aplicado em apenas quatro culturas. 

“Um total de 79% dos agrotóxicos do Brasil vai parar em apenas quatro culturas: 52% na soja, 10% no milho, 10% na cana e 7% no algodão. Quando dizem que o agro mata fome, é mentira. Pois o humano não come soja, não come milho, isso aí tudo são commodities”, resume. 

O cenário dos agrotóxicos ganha, ainda, uma peculiaridade: oito de cada dez produtos aprovados no Brasil nos últimos dois anos têm ao menos um ingrediente ativo produzido pela indústria chinesa. “A nossa dependência da China é visceral, tanto para comprar deles quanto para vender para eles”, resume Hess. 

O climatologista Carlos Nobre explica que o recorde de mudanças climáticas no Brasil, nos últimos anos, tem como uma de suas características “o aquecimento dos oceanos, que jogam mais energia na atmosfera”, tornando todos os comportamentos climáticos, como chuvas, seca ou rajadas de vento, mais intensos. “Então, uma das possibilidades concretas é de que essas rajadas de vento, mais fortes e duradouras, possam ter transportado essas substâncias para áreas tão distantes”, explica Nobre. 

Ainda segundo o pesquisador, os incêndios, que atingiram grande parte dos biomas brasileiros, também podem contribuir para que essas substâncias acessem áreas intocadas. “[Os incêndios] podem aumentar muito a temperatura, fazer esse calor subir, provocando rajadas de vento, que fazem esse transporte para longas distâncias e vários níveis de altitude”, detalha. O cenário acrescenta uma nuance aos muitos desafios já enfrentados para o controle dos agrotóxicos no Brasil.



Por: Adriana Amâncio e Mariana Rosetti. Fonte: O Joio e O Trigo.

Como o Resíduo Tóxico do Jeans Pode Virar Biofortificante


Startup pernambucana criou maneira de diminuir impacto ambiental do processo de lavagem das peças. 

Formada por três mulheres, a Germini desenvolveu uma solução para diminuir o impacto ambiental do resíduo têxtil da lavagem do jeans. A startup, incubada no Parque TeC da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), transforma o “lodo” tóxico em biofortificante. Em um laboratório, o que sai das lavanderias vira cápsulas ricas em carbono que envolvem sementes e podem ser usadas para melhorar os resultados da agricultura. 

Esse lodo residual da lavagem das peças contém fibras sintéticas e naturais, que podem ser do algodão ou até mesmo do poliéster. Quando sai das lavanderias, o material está bastante úmido e então segue para um processo de secagem no laboratório utilizado pela Germini, no Departamento de Química Fundamental da universidade. Depois de seco, ele passa por tratamento para retirar as impurezas e, em seguida, vai para um processo chamado síntese térmica, em que será aquecido a altas temperaturas. 

A síntese térmica quebra as fibras, gerando um material extremamente rico em carbono. O produto final são nanopartículas de carbono transformadas em biofortificante. A última etapa é deixar esse material gelatinoso para que ele envolva sementes, como a de feijão, aumentando a velocidade e a taxa de germinação ao fornecer nutrientes e reter água, o que é bom para a agricultura em regiões mais áridas. 

De acordo com a CEO da startup, Jéssica Vasconselos, os experimentos já permitiram diminuir o tempo de germinação em até dois dias. Se uma semente leva, por exemplo, quatro dias para germinar, com o biofortificante ela germina em dois dias. 

O processo de lavagem de um dos itens mais básicos do guarda-roupa brasileiro — necessário para tingir as peças — é bastante poluente. O despejo do lodo no esgoto ou até mesmo diretamente no rio pode causar prejuízo ao solo, à água, aos animais e às plantas. 

O agreste pernambucano tem mais de 800 lavanderias, nem metade delas trata a água da lavagem do jeans. Já o descarte dos resíduos têxteis, mesmo feito legalmente, é por si só prejudicial ao meio ambiente, pois tem como destino os aterros sanitários. Santa Cruz do Capibaribe, Toritama e Caruaru são os três principais municípios dos 11 que compõem o Polo Têxtil do Estado, um dos mais importantes do país. 

A Germini tem uma parceria com a lavanderia Nossa Senhora do Carmo, em Caruaru. Por ora, as empreendedoras têm capacidade para processar até 10 quilos de lodo têxtil por vez. “A ideia é conseguir expandir para mais lavanderias a gente tenha estrutura para comportar a demanda que existe”, Jéssica. “O plano é conseguir mais fomento para que a gente consiga crescer e realmente chegar ao mercado”, planeja. 

A ideia da Germini surgiu em 2022 durante a cadeira multidisciplinar Projeto de Inovação, conhecida na UFPE como “Projetão”, que reúne estudantes de diversos cursos. O objetivo da disciplina era encontrar uma saída que envolvesse tecnologia para resolver um problema ligado aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). 

Jéssica tem mais duas sócias, todas egressas da graduação: Tatiane Marques é administradora e Eneri Melo, engenheira da computação e técnica em química. Os mentores são os professores Severino Alves e João Bosco Paraíso da Silva. Elas estão finalizando uma etapa de testes em campo na universidade e, depois, vão partir para os testes diretamente com agricultores. 

Além do resíduo têxtil, a Germini consegue trabalhar com resíduos de qualquer setor, desde que seja matéria orgânica. “Temos capacidade para atuar, por exemplo, com a indústria alimentícia e usinas de cana-de-açúcar”, cita Jéssica.



Por: Raíssa Ebrahim. Fonte: Marco Zero.

Por Que Alergias Estão Ficando Piores Com Mudanças Climáticas?


O aumento das temperaturas globais faz com que o pólen das plantas fique suspenso no ar em maior quantidade e por mais tempo, aumentando os casos de alergia. 

Sempre podemos observar as tempestades, mas não conseguimos ver o que acontece dentro delas. 

Durante a formação da tormenta, trilhões de partículas de pólen são sugadas para as nuvens. E, quando ela acontece, a chuva, os raios e a umidade dividem todo esse pólen em fragmentos cada vez menores, que são lançados para a Terra e atingem o sistema respiratório das pessoas. 

No dia 21 de novembro de 2016, por volta das seis horas da tarde, o ar adquiriu características mortais em Melbourne, na Austrália. 

Os telefones de emergência começaram a tocar. Pessoas com dificuldade de respirar começaram a procurar os hospitais em grandes números. A demanda por ambulâncias foi tão grande que os veículos não conseguiam retirar as pessoas imobilizadas em suas casas. 

Os serviços de pronto atendimento atenderam oito vezes mais pessoas com problemas respiratórios do que o normal. E as internações hospitalares de pessoas asmáticas foram cerca de 10 vezes mais altas do que o habitual. 

Ao todo, 10 pessoas morreram, incluindo uma estudante de direito com 20 anos de idade, que morreu no gramado de casa, aguardando a ambulância, enquanto sua família tentava ressuscitá-la. 

Um sobrevivente contou que respirava normalmente e, em questão de 30 minutos, ficou ofegante em busca de ar. "Foi absurdo", declarou ele aos repórteres, no seu leito hospitalar. 

O professor e cientista especializado em saúde ambiental Paul Beggs, da Universidade Macquarie em Sydney, na Austrália, relembra bem o incidente.

"Foi um evento de massa absoluto. Sem precedentes. Catastrófico", descreve ele. "As pessoas em Melbourne, os médicos, enfermeiros e as pessoas nas farmácias – ninguém sabia o que estava acontecendo." 

Logo ficou claro que aquele foi um caso massivo de "asma de tempestade". Ela ocorre quando certos tipos de tempestades decompõem as partículas de pólen no ar, liberando proteínas e as lançando sobre as pessoas sobre a superfície, sem que elas saibam. 

Essas proteínas dispersas de forma generalizada podem causar reações alérgicas em algumas pessoas, mesmo as que não sofreram de asma anteriormente. 

Eventos como a asma de tempestade que atingiu Melbourne são um exemplo extremo de como o pólen das plantas e as alergias que ele causa são dramaticamente alterados pelas mudanças climáticas. 

Com o aumento das temperaturas, muitas regiões (especialmente os Estados Unidos, a Europa e a Austrália) vêm observando que as alergias sazonais, agora, afetam uma parcela maior da população, por períodos mais longos e com sintomas mais graves, segundo os cientistas. 

Neste ano, previsões indicam que os níveis de pólen em 39 Estados americanos ficarão acima da média histórica da estação. E os especialistas alertam que esta situação provavelmente só irá se agravar nos próximos anos. 

O pólen é uma parte essencial e onipresente do nosso mundo. Suas partículas microscópicas passam por entre as plantas e permitem a sua reprodução. 

Enquanto algumas plantas espalham seu pólen com a ajuda dos insetos, outras dependem do vento. Elas emitem imensas quantidades da substância em pó pelo ar. 

Muitas espécies de árvores, gramas e ervas dependem da dispersão do pólen pelo vento. São estas as maiores causadoras das alergias sazonais – a chamada febre do feno. 

A alergia ocorre quando o nosso sistema imunológico, por erro, identifica o pólen como uma substância nociva. Ele, então, aciona uma reação normalmente reservada para vírus ou bactérias patogênicas. Os sintomas comuns podem incluir coriza, irritação nos olhos e espirros. 

Em alguns casos, as alergias sazonais podem causar dificuldades respiratórias. Isso ocorre quando a inflamação das vias aéreas causa inchaço, o que dificulta a chegada de ar suficiente aos pulmões. 

Melbourne passou a ser o infeliz epicentro da asma de tempestade. Foram sete eventos significativos registrados desde 1984. 

Mas incidentes similares já ocorreram em todo o mundo, desde Birmingham, no Reino Unido, até Atlanta, no Estado americano da Geórgia. 

Estes eventos ainda são raros, mas as mudanças climáticas podem estar aumentando a probabilidade de incidência da asma de tempestade. 

Um dos motivos é o aumento da temporada do pólen, além da maior frequência dos eventos climáticos extremos, incluindo as tempestades. 

Não é possível determinar a influência exata das mudanças climáticas sobre o caso de asma de tempestade de 2016 em Melbourne. Mas Beggs tem "razoável certeza" de que houve algum impacto. 

"Sabemos que as mudanças climáticas geram aumento da quantidade de pólen na atmosfera", explica ele. "Elas estão mudando a sazonalidade do pólen. Estão alterando os tipos de pólen a que somos expostos." 

Beggs pesquisa extensamente a asma de tempestade e publicou um estudo em 2024, examinando as relações entre este fenômeno e as mudanças climáticas. 

As tempestades alimentam o pólen 

Ainda não conhecemos a forma exata em que as tempestades ativam ou exacerbam a asma. 

A principal teoria é que as correntes de ar frio descendentes que ocorrem nos sistemas meteorológicos durante as tempestades geram fortes ventos cruzados que sopram na superfície, carregando os grãos de pólen e esporos fúngicos das gramas e de outras plantas. 

Eles são levados para grandes altitudes pelas correntes de ar ascendentes, até o sistema de tempestade. Lá chegando, a umidade das nuvens faz com que eles se expandam e se dividam em fragmentos menores, aumentando massivamente a quantidade de partículas alergênicas no ar. 

O forte campo elétrico que se desenvolve durante as tempestades também pode intensificar a desintegração do pólen. 

Quando os ventos cruzados frios transportam os fragmentos de pólen de volta para a superfície da Terra, o menor tamanho das partículas facilita sua entrada nas vias respiratórias. 

Estudos do fenômeno indicam que os níveis de pólen parecem atingir seu pico nos primeiros 20-30 minutos de tempestade. E o pólen parece afetar particularmente os mais jovens. 

O aumento da temporada de pólen 

Felizmente, os grandes eventos de asma de tempestade ainda são raros. Mas as mudanças climáticas estão aumentando o risco de exposição das pessoas ao pólen por outras vias. 

De um lado, o aumento das temperaturas significa que as temporadas de pólen – a época do ano em que as plantas emitem as partículas, tipicamente na primavera e no verão – agora começam mais cedo e duram mais tempo, segundo a cientista de saúde pública Elaine Fuertes. Ela é especialista em meio ambiente e doenças alérgicas do Instituto Nacional do Pulmão e Coração do Imperial College, no Reino Unido. 

"Você terá pessoas apresentando sintomas mais cedo ao longo do ano, por um período de tempo maior", explica ela. 

Em algumas partes do mundo, como a Europa e os Estados Unidos, um dos principais culpados é a ambrósia, um vasto grupo de plantas produtoras de flores, que muitas pessoas consideram ervas daninhas. 

Existem diversas espécies de ambrósia espalhadas pelo mundo, que podem produzir quantidades alucinantes de pólen. Uma única planta é capaz de emitir um bilhão de grãos de pólen. 

A ambrósia cresce nos jardins e nas fazendas, além de cantos e fendas nos ambientes urbanos. E as alergias causadas pelo pólen da ambrósia já afetam cerca de 50 milhões de pessoas, somente nos Estados Unidos. 

Um estudo analisou dados de 11 locais na América do Norte entre 1995 e 2015 e concluiu que 10 deles apresentam temporadas mais longas de pólen de ambrósia – alguns deles, muito mais longas. 

Naquele período de 20 anos, a temporada aumentou em 25 dias em Winnipeg (Manitoba, Canadá), 21 dias em Fargo (Dakota do Norte, EUA) e 18 dias em Mineápolis (Minnesota, EUA). 

"O inverno se aquece, a primavera começa mais cedo e o outono se atrasa. Por isso, o tempo que você passa em ambiente externo, em contato com o pólen alérgico, certamente está aumentando", afirma o professor de ciências da saúde ambiental Lewis Ziska, da Universidade Columbia em Nova York, nos Estados Unidos. Ele participou dos estudos sobre a temporada do pólen de ambrósia. 

Estas mudanças são mais drásticas no norte da América do Norte, Europa e Ásia, segundo Ziska, além da Austrália e do sul da África e da América do Sul. E, se não houver reduções imediatas das emissões de gases do efeito estufa, o efeito provavelmente só irá se agravar. 

Um estudo de 2022, por exemplo, estimou que, até o final do século, as temporadas de pólen irão começar até 40 dias antes e terminar até 15 dias depois do período atual. Isso potencialmente indica que haverá dois meses a mais de sintomas por ano, entre as pessoas que sofrem da febre do feno. 

Mas não é apenas o tempo de exposição das pessoas aos alérgenos que está aumentando. A quantidade de alérgenos no ar também está crescendo em muitas partes do planeta. 

Nos anos 2000, a temporada do pólen na área continental dos Estados Unidos começou três dias antes do verificado na década de 1990. E a quantidade de pólen no ar também foi 46% maior. 

Isso ocorreu, em parte, porque os níveis de dióxido de carbono (CO₂) na atmosfera estão aumentando, devido às emissões causadas pelas atividades humanas. E muitas das plantas que causam maior prejuízo para as pessoas que sofrem da febre do feno se multiplicam na presença de CO₂. 

Em um estudo, pesquisadores cultivaram um certo tipo de grama sob diferentes concentrações de CO₂. 

Eles concluíram que as flores de plantas cultivadas em atmosfera contendo 800 partes por milhão (ppm) de CO₂ produziram cerca de 50% mais pólen do que aquelas cultivadas em ar contendo 400 ppm (o nível atual de CO₂ na atmosfera da Terra). 

De forma similar, outros cientistas também testaram o cultivo de diferentes tipos de carvalho, cujo pólen costuma causar febre do feno em países como a Coreia do Sul. 

Em um cenário de 720 ppm de CO₂, eles concluíram que cada carvalho apresenta contagem média de pólen 13 vezes maior do que as árvores expostas a 400 ppm. E, mesmo a 560 ppm, a produção de pólen foi 3,5 vezes maior do que os níveis atuais. 

Espécies invasoras 

Ziska é o autor do livro Greenhouse Planet ("Planeta estufa", em tradução livre), publicado em 2022. Ele realizou experimentos similares com a ambrósia e seus resultados confirmam os de outros pesquisadores. 

"Sempre que aumentamos o dióxido de carbono, a ambrósia reage", ele conta. "Ela cresce mais. Ela produz mais pólen." 

"E houve algumas evidências de que ela produz uma forma mais alergênica do pólen, que pode induzir nosso sistema imunológico a reagir ainda mais que no passado", segundo Ziska. 

A difusão de espécies invasoras em outras partes do mundo também aciona reações alérgicas em outras populações humanas. A ambrósia, por exemplo, é originária da América do Norte, mas ela se espalhou pela Europa, Austrália, Ásia e América do Sul. 

Atualmente, cerca de 60% das pessoas da Hungria, 20% da Dinamarca e 15% da Holanda já manifestam sensibilidade ao pólen deste prolífico grupo de plantas. 

Isso é especialmente preocupante porque se estima que, até 2050, a concentração de pólen de ambrósia no ar seja cerca de quatro vezes maior do que a atual. 

Até mesmo em partes da Europa onde o pólen de ambrósia é virtualmente ausente hoje em dia, como o sul do Reino Unido e a Alemanha, "os níveis de pólen passam a ser substanciais", em cenários climáticos moderados ou mais altos, segundo os pesquisadores no estudo de 2015. 

Os cientistas indicam que cerca de um terço do aumento se deve à contínua expansão das espécies invasoras. Os dois terços restantes são especificamente causados pelas mudanças climáticas, incluindo a extensão da temporada de crescimento, com o aumento das temperaturas. 

"Será, portanto, uma temporada mais longa, que começa mais cedo e mais intensa para quem sofre de sintomas alérgicos", explica Fuertes, "e, com isso, aumenta o risco de nova sensibilização para populações anteriormente não expostas." 

Nem todas as regiões do mundo observarão aumento da produção de pólen. 

Alguns pesquisadores concluíram, por exemplo, que o sul da Califórnia irá enfrentar temporadas de pólen que começarão mais cedo, mas serão menos produtivas. O motivo, em grande parte, é a redução das chuvas. 

Mas estas previsões não consideram todos os possíveis efeitos das mudanças climáticas sobre os alérgenos suspensos no ar. 

Pode também haver, por exemplo, consequências à saúde devido à maior probabilidade de incêndios florestais, o que aumenta o risco dos sintomas de asma e alergia. 

Em termos relativos, Fuertes indica que a quantidade de pólen suspensa no ar ainda irá variar de um ano para outro. Mas isso pode não auxiliar muito as pessoas que sofrem da febre do feno. 

"Quando você tem sensibilidade e desenvolve sintomas alérgicos, provavelmente irá apresentar sintomas nos anos em que os níveis de pólen estejam abaixo da média", explica ela. "Você irá reagir ao pólen que está à sua volta." 

O que as pessoas podem fazer a respeito?

Reduzir as emissões de carbono ajudaria a evitar alguns dos impactos climáticos mais sérios e outras estratégias também poderão reduzir o problema. E talvez também seja possível fazer intervenções diretas mais drásticas. 

Um século atrás, algumas cidades americanas chegaram a formar comitês para combater a ambrósia. "Chicago emprega 1.350 pessoas no combate à febre do feno", anuncia uma manchete de 1932. 

A reportagem explica que os homens, antes desempregados devido à Grande Depressão, recebiam o equivalente a uma semana de alimentação e moradia (e "25 centavos em dinheiro") por dia passado cortando a planta. 

A medida pode parecer curiosa, mas fez diferença. Um estudo de 1956 sobre a Operação Ambrósia na cidade de Nova York estimou que o corte das plantas pela multidão reduziu a produção de pólen em cerca de 50%. 

Atualmente, podemos encontrar ações coordenadas em andamento na Europa. 

Em Berlim, na Alemanha, trabalhadores foram destacados para encontrar e eliminar a ambrósia em toda a cidade. Já a Suíça proibiu a importação ou venda da planta em 2024 e formou grupos de voluntários para patrulhar os parques públicos para arrancá-la. 

Outras soluções exigem design urbano mais inteligente. 

"Precisamos definitivamente tornar nossas cidades verdes", afirma Elaine Fuertes. "Mas precisamos fazer isso criteriosamente." 

O plantio de espécies exóticas, por exemplo, pode causar novas alergias. 

O chamado "sexismo botânico" – a escolha de árvores machos produtoras de pólen em algumas espécies, em vez das fêmeas produtoras de frutos e sementes, de manejo complicado – também pode aumentar os níveis de pólen em áreas urbanas. Mas estudos demonstraram que o efeito deste viés é relativamente pequeno em grandes cidades, como Nova York. 

Também é importante monitorar e prever os níveis de pólen, segundo os cientistas. 

"Precisamos saber o que estamos respirando", explica Paul Beggs. "É algo bastante fundamental em termos da nossa saúde." 

Ele destaca que a maioria das pessoas sabe que pode conseguir informações válidas, confiáveis e em tempo real sobre índices como a temperatura ou os níveis de chuva na sua região. Mas relativamente poucos podem dizer o mesmo sobre os alérgenos suspensos no ar. 

Mas mesmo os serviços que apresentam modelos de contagem de pólen de forma abrangente e detalhada, como o Instituto Meteorológico Finlandês, não monitoram nem elaboram modelos dos níveis de alérgenos suspensos no ar com mais precisão. Afinal, cada grão de pólen pode liberar diferentes quantidades de alérgenos, que podem variar de acordo com as condições meteorológicas. 

Fuertes destaca que esta é uma medição diferente, mais relacionada aos sintomas alérgicos. 

"Ninguém mede os níveis de alérgenos regularmente", afirma ela. "Nós deveríamos estar desenvolvendo isso." 

De forma geral, os especialistas afirmam que a ciência é clara. Sem ações concretas e coordenadas, as mudanças climáticas continuarão a agravar a febre do feno em muitas regiões do planeta. 

Isso poderá incluir eventos mortais mais dramáticos, como a asma de tempestade. Mas também pode significar mais pessoas fungando e sofrendo, por mais tempo, todos os anos. 

"Temos, agora, os estudos que demonstram os impactos sobre a saúde humana", afirma Beggs. "E ainda há mais vindo por aí."



Por: Amanda Ruggeri. Fonte: BBC Future.

Menos de 10% do Plástico no Mundo é Reciclado, revela estudo


Produção ainda é dominada pelo uso de combustíveis fósseis. Até 2050, produção global de plásticos deverá dobrar e chegar a 800 milhões de toneladas por ano. Pesquisadores alertam para desafio ambiental e climático. 

Apenas 9,5% do plástico mundial é produzido a partir de material reciclado, estimou um novo estudo divulgado no dia 10 de abril. O restante é quase totalmente produzido a partir da extração de combustíveis fósseis, predominantemente petróleo e gás. 

Os pesquisadores da Universidade de Tsinghua, na China, alertam que a reciclagem insuficiente impõe desafios ambientais e climáticos cada vez maiores, uma vez que a produção de plástico continua a crescer. 

O estudo se baseia em dados de 2022, quando foram produzidos 400 milhões de toneladas de plástico, em comparação a dois milhões em 1950. A previsão é que o volume chegue a 800 milhões de toneladas em 2050. 

"A taxa de reciclagem global permaneceu estagnada, refletindo pouca melhora em relação aos anos anteriores”, escreveram os autores na revista Communications Earth & Environment, do grupo Nature. "A alta dependência de matérias-primas de combustíveis fósseis para a produção de plásticos comprometerá ainda mais os esforços globais para mitigar as mudanças climáticas.” 

Para alcançar estas conclusões, os estudiosos usaram estatísticas nacionais, relatórios da indústria e bases de dados internacionais, a fim de criar a primeira análise global detalhada do setor de plásticos, incluindo as fases de produção, uso e descarte. 

Problemas da produção ao consumo

Os obstáculos técnicos que ainda dificultam a reciclagem incluem a contaminação do plástico por comida e embalagens e a presença de aditivos complexos e diversos ao material. 

Entretanto, outro impeditivo é puramente econômico: é muitas vezes mais barato produzir plástico novo ou "virgem” do que reciclar. 

"Essa barreira econômica desestimula o investimento em infraestrutura e tecnologia de reciclagem, perpetuando o ciclo de baixas taxas de reciclagem”, escreveram os autores. 

Os Estados Unidos, o maior consumidor de plástico per capita, tem uma das menores taxas de reciclagem, com apenas 5% de reutilização. Um americano consome, em média, 216 quilos de plástico ao ano. Já a China foi o país com o maior consumo absoluto, de 80 milhões de toneladas ao ano. 

Cada vez mais incineração 

Os pesquisadores do estudo chinês também observaram uma "mudança significativa” no descarte global de resíduos, com declínio do uso de aterros sanitários e o aumento da incineração. 

Cerca de um terço dos resíduos plásticos foram incinerados em 2022, com a China, o Japão e a União Europeia tendo a maior taxa de incineração. Enquanto isso, 40% do plástico vai parar em aterros, que ainda são o maior destino do material, apesar de o índice ter caído em comparação aos 79% registrados entre 1950 e 2015. 

Em setembro de 2024, um estudo separado publicado na Nature por pesquisadores da Universidade de Leeds concluiu que a queima de plástico em lixões e fogueiras era um problema tão grande para o planeta quanto o acúmulo de lixo. 

A queima informal de plástico, principalmente em países mais pobres onde não existem alternativas, espalha o plástico no meio ambiente, piora a qualidade do ar e expõe os trabalhadores a produtos químicos tóxicos, argumentou a pesquisa. 

Negociações internacionais 

Para a Ethel Eljarrat, Diretora do Instituto de Diagnóstico Ambiental e Estudos da Água (IDAEA-CSIC) na Espanha, é urgente chegar a acordos internacionais para conter a poluição plástica com medidas variadas. Dentre elas, estão incluídas a imposição de um teto para a produção global de plástico virgem, a promoção de ajuda para a implementação de bioplásticos, a regulamentação ou a proibição do uso de aditivos tóxicos e melhorias nos sistemas de reciclagem mecânica e química. 

"Materiais alternativos mais biodegradáveis não estão encontrando seu lugar no mercado, talvez devido às barreiras econômicas e tecnológicas para seu uso em larga escala. Também não conseguimos eliminar a presença de aditivos tóxicos nos plásticos, e a capacidade de reciclagem de material plástico ainda é insuficiente”, disse a especialista. 

As descobertas dos pesquisadores da China vêm num momento em que os países se preparam para mais uma vez negociar um tratado sobre a poluição por plástico. A última rodada falhou em chegar a um acordo, e as conversas deverão ser retomadas em Genebra em agosto.



Fonte(s): DW / AFP / RFI

A Computação Quântica Pode Mudar A Ciência Para Sempre (se funcionar!)


Big techs acreditam que a computação quântica vai turbinar a IA. Mas antes, precisam resolver seu maior problema: escalar qubits. 

A inteligência artificial já transformou a forma como empresas processam dados e tomam decisões. Mas os maiores nomes do Vale do Silício estão de olho no que pode ser o próximo grande avanço tecnológico: a computação quântica, celebrada no dia 14/04.

A data do Dia da Computação Quântica foi escolhida em referência a um dos pilares da física quântica, a constante de Planck – aproximadamente 4,14 x 10⁻¹⁵ eV·s (lembrando que, na grafia de datas em inglês, o mês vem antes do dia, por isso 4/14). 

Diferente da IA, que acelera processos existentes, a computação quântica promete desbloquear capacidades totalmente novas – desde simulações de moléculas para a descoberta de medicamentos até a resolução de problemas que estão muito além do alcance dos supercomputadores mais rápidos de hoje. Segundo a consultoria McKinsey, o setor deve atingir US$ 2 trilhões até 2035. 

Gigantes da tecnologia como Microsoft, Amazon, Google e Nvidia estão desenvolvendo suas próprias tecnologias quânticas, explorando como integrá-las a modelos de IA para criar uma infraestrutura pronta para o futuro. Mas há um grande obstáculo: escalar os qubits. 

Qubits – as unidades fundamentais de dados quânticos – precisam ser escalados para milhares para que a computação quântica ultrapasse as capacidades da IA. Diferente dos bits clássicos, que existem como 0 ou 1, os qubits podem existir em múltiplos estados simultaneamente, permitindo um processamento exponencialmente mais rápido de cálculos complexos. 

Para enfrentar esse desafio, a Atom Computing, sediada na Califórnia, está trabalhando com a Microsoft. Em setembro de 2024, a Microsoft anunciou uma colaboração com a Atom para construir a máquina quântica mais poderosa do mundo, oferecendo um sistema comercial escalável disponível para encomenda. 

Em novembro de 2024, as empresas haviam entrelaçado 24 qubits lógicos e executado com sucesso um algoritmo quântico com 28 qubits lógicos. Em 2025, o sistema da Atom baseado em átomos neutros conta com 1.180 qubits. Mas será que a tecnologia já está pronta para casos de uso complexos no mundo real? 

“Não existe um número único e concreto de qubits lógicos com métricas de desempenho associadas que, de repente, desbloqueiem todas as aplicações possíveis”, diz Remy Notermans, diretor de planejamento estratégico da Atom Computing. 

“Com cerca de 100 qubits lógicos já é possível explorar certas aplicações científicas que vão muito além das capacidades da computação clássica. Aplicações economicamente viáveis devem se tornar acessíveis com cerca de mil qubits lógicos.” 

Os sistemas da Atom Computing utilizam átomos neutros presos como qubits – uma abordagem proprietária que permite controle preciso. Diferente dos átomos ionizados, os átomos neutros mantêm todos os seus elétrons. 

A empresa também utiliza resfriamento a laser e pinças ópticas para prender e manipular átomos individualmente. Outras empresas de computação quântica – como D-Wave, Phasecraft, Zapata Computing e Algorithmiq – também estão desenvolvendo infraestrutura e algoritmos para otimizar o hardware quântico atual. 

Investidores apostam na integração da computação espacial com IA 

Além do desafio de escalar qubits, a computação quântica exige quantidades imensas de capital. “Tecnologia quântica prática não deve ser avaliada com as mesmas expectativas de cronograma da indústria de software”, afirma Justin Ging, diretor de produtos da Atom Computing. 

Embora a computação quântica ainda esteja evoluindo rumo à viabilidade comercial, as grandes empresas de tecnologia estão apostando no seu potencial para melhorar o desempenho dos modelos de IA. Esses modelos exigem quantidades massivas de energia, mas a integração com a computação quântica pode aumentar a eficiência e ampliar as capacidades de raciocínio. 

Um avanço notável no setor de IA quântica é o chip Willow, do Google, que resolveu um problema de amostragem aleatória de circuitos em apenas cinco minutos – uma tarefa que, segundo a própria empresa, levaria 10 septilhões de anos para ser completada pelo supercomputador mais rápido do mundo. 

“Os modelos de IA atuais são treinados com conjuntos massivos de dados, baseados principalmente na experiência humana”, explica Notermans. “Se um modelo de IA for usado sozinho para responder uma pergunta relacionada à descoberta de medicamentos, haverá uma incerteza significativa quanto à confiabilidade dessa resposta.” 

Ele afirma que computadores quânticos podem ser usados em conjunto com a IA para gerar dados baseados em física quântica, enriquecendo os conjuntos de dados de treinamento e tornando o desempenho geral dos modelos de IA mais preciso. 

Se uma nova e poderosa forma de computação vai surgir da combinação entre os paradigmas clássico e quântico para transformar a IA, é algo que só o tempo dirá.



Por: Victor Dey. Fonte: Fast Company Brasil.

K2-18b: O Que Se Sabe Sobre Descoberta Além da Terra?


Foram detectadas na atmosfera desse planeta impressões químicas de gases que, na Terra, são produzidos apenas por processos biológicos. 

Com a ajuda do telescópio espacial James Webb, cientistas anunciaram uma descoberta que pode revolucionar a busca pela vida fora da Terra: foram detectados, na atmosfera de outro planeta, gases que, no nosso planeta, só são produzidos por processos biológicos. 

Segundo os pesquisadores, esses são sinais mais fortes até agora de possível vida além do nosso sistema solar. 

Confira abaixo perguntas e respostas com o resumo sobre o que se sabe até agora sobre a descoberta: 

1. O que os pesquisadores anunciaram objetivamente? 

Os cientistas que conduziram a pesquisa anunciaram que foram detectadas na atmosfera de um planeta alienígena as impressões químicas de gases que, na Terra, são produzidos apenas por processos biológicos. 

Os dois gases — dimetil sulfeto (DMS) e dissulfeto de dimetila (DMDS) — observados no planeta chamado K2-18b, são gerados na Terra por organismos vivos, principalmente por vida microbiana como o fitoplâncton marinho (algas). 

2. Quem conduziu a pesquisa e onde foi publicada? 

A pesquisa foi conduzida por uma equipe de cientistas da Universidade de Cambridge, nos Estados Unidos. O estudo tem como principal autor o astrônomo da universidade, Nikku Madhusudhan. 

Os resultados foram publicados na revista científica Astrophysical Journal

3. A descoberta é uma prova de vida alienígena? 

Ainda não. De acordo com os cientistas, a descoberta sugere que o planeta pode estar repleto de vida microbiana, segundo os pesquisadores. 

No entanto, eles enfatizaram que não estão anunciando a descoberta de organismos vivos, mas sim de uma possível bioassinatura — um indicativo de processo biológico — e que os achados devem ser vistos com cautela. 

Ainda assim, eles demonstram entusiasmo. “Esses são os primeiros indícios de um mundo alienígena possivelmente habitado”, disse o astrofísico Nikku Madhusudhan. 

Segundo os pesquisadores, nesse planeta, caso exista, é de se esperar vida microbiana, possivelmente semelhante à encontrada nos oceanos da Terra. Os oceanos desses planetas seriam mais quentes. 

Quanto à possibilidade de organismos multicelulares ou vida inteligente, Madhusudhan é cauteloso: “Não podemos responder essa pergunta neste estágio. A suposição básica é de vida microbiana simples.” 

4. Já é uma prova definitiva ou mais observações são necessárias? 

Apesar de verem a descoberta com muito otimismo e entusiasmo, os cientistas admitem que ainda são necessários mais estudos e observações. 

“Primeiro, precisamos repetir as observações duas ou três vezes para garantir que o sinal é real e aumentar a significância da detecção, até que a probabilidade de erro estatístico seja menor que uma em um milhão”, disse Madhusudhan. 

Ele ainda afirmou que é preciso realizar mais estudos teóricos e experimentais para garantir se não há um mecanismo abiótico (sem envolver vida) que possa produzir DMS ou DMDS em uma atmosfera como a do K2-18b. 

5. Quais os anúncios anteriores mais relevantes? 

Desde os anos 1990, cerca de 5.800 exoplanetas (planetas fora do nosso sistema solar) foram descobertos. Cientistas têm criado hipóteses sobre a existência dos chamados mundos hycean — cobertos por oceanos de água líquida habitáveis por microrganismos, com atmosfera rica em hidrogênio. 

Observações anteriores do Webb, que foi lançado em 2021 e entrou em operação em 2022, já haviam identificado metano e dióxido de carbono na atmosfera de K2-18b — a primeira vez que moléculas baseadas em carbono foram detectadas na atmosfera de um exoplaneta na zona habitável de uma estrela. 

6. Os seres humanos vão poder habitar esse planeta? 

É impossível afirmar isso ainda. Ainda que a descoberta seja um avanço na busca por vida em outros planetas e seja extremamente relevante, é cedo para concluir quais serão os próximos passos dessa descoberta. 

É uma pista. Mas ainda não podemos concluir que seja habitável", afirmou o cientista planetário da Universidade Johns Hopkins, Stephen Schmidt, ao jornal The New York Times. 

Isso porque primeiro é preciso descobrir se realmente há vida nesse planeta para, só então, entender as condições que permitem que esses organismos sobrevivam. 

7. Quais as características desse planeta que pode abrigar vida? 

K2-18b é 8,6 vezes mais massivo que a Terra e tem um diâmetro cerca de 2,6 vezes maior. Ele orbita na “zona habitável” — uma distância de sua estrela onde a água líquida pode existir na superfície — de uma anã vermelha menor e menos luminosa que o Sol, localizada a cerca de 124 anos-luz da Terra, na constelação de Leão. 

Ele pertence à classe de planetas “sub-Netuno”, com diâmetro maior que o da Terra, mas menor que o de Netuno (o menor gigante gasoso do nosso sistema solar). 

Um “mundo hycean”
 

“O único cenário que atualmente explica todos os dados obtidos até agora pelo JWST, incluindo as observações passadas e atuais, é aquele onde K2-18b é um mundo hycean repleto de vida”, disse Madhusudhan. “No entanto, precisamos estar abertos e continuar explorando outros cenários.” 

Segundo ele, nesses mundos, caso existam, é de se esperar vida microbiana, possivelmente semelhante à encontrada nos oceanos da Terra. Os oceanos desses planetas seriam mais quentes. Quanto à possibilidade de organismos multicelulares ou vida inteligente, Madhusudhan foi cauteloso: “Não podemos responder essa pergunta neste estágio. A suposição básica é de vida microbiana simples.” 

Os gases DMS e DMDS, pertencentes à mesma família química, têm sido apontados como importantes bioassinaturas em exoplanetas. O telescópio detectou a presença de um ou outro (ou ambos) na atmosfera do planeta com 99,7% de confiança estatística, o que ainda deixa uma chance de 0,3% de ser um erro ou ruído estatístico. 

Eles foram detectados em concentrações atmosféricas superiores a 10 partes por milhão em volume. 

“Para comparação, isso é milhares de vezes maior do que suas concentrações na atmosfera da Terra, e não pode ser explicado sem atividade biológica, segundo o conhecimento atual”, afirmou Madhusudhan. 

Cientistas que não participaram do estudo recomendaram cautela. 

“Os dados de K2-18b são riquíssimos, tornando-o um mundo fascinante”, disse Christopher Glein, cientista do Southwest Research Institute, no Texas. “Esses novos dados são uma contribuição valiosa, mas devemos testá-los o máximo possível. Espero ver mais análises independentes já na próxima semana.” 

Método de trânsito 

K2-18b pertence à classe de planetas “sub-Netuno”, com diâmetro maior do que o da Terra, mas menor do que o de Netuno (o menor gigante gasoso do nosso sistema solar). 

Para determinar a composição química da atmosfera de um exoplaneta, os astrônomos analisam a luz de sua estrela enquanto o planeta passa na frente dela do ponto de vista da Terra — isso é chamado de método de trânsito. Durante esse trânsito, parte da luz da estrela atravessa a atmosfera do planeta e, ao ser captada pelo telescópio, permite determinar os gases presentes. 

As observações anteriores do Webb já haviam sugerido a presença de DMS. As novas observações usaram um instrumento diferente e outra faixa de luz para confirmação. 

“O Santo Graal da ciência de exoplanetas”, disse Madhusudhan, “é encontrar evidências de vida em um planeta parecido com a Terra, fora do nosso sistema solar.” 

Madhusudhan disse que a humanidade se pergunta há milênios se estamos sozinhos no universo, e que agora talvez estejamos a apenas alguns anos de descobrir possível vida alienígena em um mundo hycean

Mas ele ainda pediu prudência: 

“Primeiro, precisamos repetir as observações duas ou três vezes para garantir que o sinal é real e aumentar a significância da detecção, até que a probabilidade de erro estatístico seja menor que uma em um milhão”, disse. 

“Segundo, precisamos de mais estudos teóricos e experimentais para garantir se não há um mecanismo abiótico (sem envolver vida) que possa produzir DMS ou DMDS em uma atmosfera como a de K2-18b.” 

Apesar de estudos anteriores já considerarem esses gases como bioassinaturas confiáveis, inclusive nesse planeta, Madhusudhan conclui: 

“É um grande 'se' os dados estarem mesmo apontando para vida. E não interessa a ninguém afirmar prematuramente que detectamos vida.”



Por: Júlia Carvalho. Fonte: G1.

Mortes Por Poluição do Ar Expõem Desafios da Indústria no Brasil


Concentração industrial aumenta mortalidade, reforçando a urgência de mais monitoramento e ações para reduzir emissões.

Os municípios brasileiros com algumas das maiores taxas de mortalidade relacionadas à poluição do ar estão em regiões de intensa atividade industrial. É o que mostra um levantamento do Dialogue.Earth com base em dados do Painel Vigiar, plataforma lançada em 2024 pelo governo federal para monitorar a poluição e seus impactos no país. 

Diversas cidades com forte atividade industrial no estado de São Paulo, o mais desenvolvido do país, figuram no topo do ranking. Por exemplo, São Caetano do Sul, no polo industrial do ABC Paulista, registrou 320 mortes atribuídas à poluição do ar para cada 100 mil habitantes entre 2021 e 2023 — a média brasileira no período foi de 83 por 100 mil habitantes. Outros destaques incluem Osasco, Guarulhos e a capital São Paulo, que também figuram entre as cidades mais poluídas do país, segundo a plataforma World Air Quality

No Brasil, os maiores emissores de gases do efeito estufa são as atividades agropecuárias e as mudanças no uso da terra, que incluem os incêndios florestais relacionados ao desmatamento da Amazônia — ambos representando quase 80% das emissões domésticas. Porém, os dados do Painel Vigiar destacam o maior impacto da poluição causada pelas indústrias na saúde humana. Outros fatores, como as emissões dos transportes, também podem influenciar os resultados. 

“Diria que os dois tipos de poluição [de queimadas e indústrias] são ruins, mas a poluição industrializada e de transporte têm efeito de longo prazo, é contínua”, disse Ethel Maciel, secretária de Vigilância em Saúde e Ambiente no Ministério da Saúde, responsável pelo lançamento do painel. 

Indústria pesada está associada a taxas elevadas de mortalidade por poluição do ar 

Os 10 municípios brasileiros com as maiores taxas de mortalidade atribuíveis à poluição do ar entre 2021-2023, estimadas a cada 100 mil habitantes. 
Cidades com alta atividade industrial estão em vermelho [clique no gráfico para ampliar].

Nota: as cidades com alta atividade industrial foram identificadas com base em dados oficiais sobre a participação da indústria no valor agregado bruto do município, bem como na classificação dos cem municípios com maior valor agregado bruto na indústria. Fonte de dados: Painel Vigiar, IBGE • Gráfico: Dialogue Earth. 

O Painel Vigiar contabiliza mortes associadas à poluição atmosférica, incluindo casos de câncer de pulmão, doenças pulmonares que afetam os sistemas circulatório e respiratório, além de infecções nas vias aéreas inferiores. Entre outros fatores, essas condições estão relacionadas à exposição ao material particulado fino (MP2.5), liberado por veículos, processos industriais, incêndios florestais e outras atividades humanas. 

Até o ano passado, o Brasil não contava com uma política para enfrentar o problema. Após 35 anos de debates, o país finalmente instituiu em maio a Política Nacional da Qualidade do Ar, que inclui iniciativas como o lançamento do painel. 

“O monitoramento permite a criação de políticas públicas”, afirmou Maciel, destacando como exemplo a cidade de Paris, que adota medidas como a restrição da circulação de veículos quando os níveis de poluição atingem valores críticos. “Tudo isso [deve ser] debatido com a sociedade e implementado por meio de leis”, acrescentou. 

Mortes por poluição e o desafio da descarbonização 

Um estudo publicado no periódico Lancet mostrou que a poluição atmosférica provocou 6,7 milhões de mortes no mundo em 2019. 

Paulo Saldiva, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e especialista em poluição atmosférica, explica que a exposição prolongada à poluição pode causar danos severos à saúde. Segundo ele, a fuligem acumulada no organismo atua como uma “tatuagem pulmonar”, espalhando-se pelos tecidos e desencadeando uma inflamação crônica. “Isso faz nosso tempo biológico correr mais depressa”, disse. 

Mesmo com os avanços do setor industrial para reduzir suas emissões, a contaminação ainda é grande. Indústrias de cimento, aço, vidro, química, alumínio, papel e celulose encontram mais dificuldades, pois dependem de altas temperaturas em seus processos, exigindo maior consumo de energia e gerando mais emissões. 

“Tem setores que já investiram bastante em descarbonização, como, por exemplo, o do cimento; e outros ainda precisam evoluir”, disse Davi Bomtempo, superintendente de meio ambiente e sustentabilidade da Confederação Nacional da Indústria (CNI). 

Um estudo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, publicado em 2017, revelou que a poluição do ar ultrapassa os limites da legislação brasileira em Volta Redonda, cidade que sedia a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), a maior do setor no país. Os índices foram estabelecidos em 1990 pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), responsável pela normatização da política ambiental no Brasil. 

Autora do estudo, a engenheira ambiental Náthaly Tonon afirmou que, sete anos após sua publicação, não houve avanços significativos em Volta Redonda: “É visível um recrudescimento nas questões da qualidade do ar, visto que a poluição agora tem alcançado bairros mais afastados”. 

De acordo com Tonon, a CSN tinha até setembro de 2024 para atender ao termo de ajustamento de conduta que exigia a modernização de seus equipamentos para reduzir a emissão de poluentes. No entanto, as medidas foram cumpridas apenas parcialmente, levando o governo estadual a estender o prazo para 2026. 

Tonon ressalta que os poluentes industriais causam tantos impactos à saúde quanto ao meio ambiente. As condições de saúde vão desde as monitoradas pelo Painel Vigiar como asma, bronquite crônica, enfisema pulmonar e outras. Na área ambiental, a poluição do ar está associada à chuva ácida, danos à biodiversidade e intensificação das mudanças climáticas. 

“A poluição cria ilhas urbanas de calor, além de afetar a circulação do vento e os padrões de precipitação local”, explicou a engenheira ambiental. 

Eficiência reduz poluição 

Venilton Tadini, presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base, comenta que, para reduzir a poluição do ar provocada pelas indústrias, é fundamental aumentar a eficiência do setor — o que vem ocorrendo a partir de inovação digital e inteligência artificial. Porém, isso pode trazer um efeito colateral: maior demanda de eletricidade. 

“Quanto mais você aumenta a capacidade de automação e eficiência da sua indústria, maior o consumo de energia pelos servidores”, explica Tadini. 

Ele explicou que é possível melhorar a eficiência de uma siderúrgica com a adoção de novos fornos ou a modernização da estrutura de laminação, por exemplo. No entanto, essas mudanças demandam mais energia das centrais de processamento de dados. 

Impulsionado pelos setores de inteligência artificial e criptomoedas, a demanda de energia das centrais de dados pode dobrar até 2026, segundo um relatório da Agência Internacional de Energia do ano passado. 

Bomtempo, da CNI, ressalta que, para atender a esse aumento de demanda por eletricidade, o Brasil precisa planejar a expansão de sua capacidade instalada, evitando o uso de usinas térmicas que dependem de fontes fósseis para gerar energia. 

A maioria dos servidores de dados está localizada nos Estados Unidos e na Europa. Isso significa que, para as indústrias brasileiras se tornarem mais verdes, elas também precisam considerar o consumo de energia desses servidores internacionais, que geralmente é fornecida por fontes fósseis

Logística industrial também polui 

A logística tanto no entorno de parques industriais quanto do transporte de cargas traz outros desafios ao setor. Um relatório com dados de 2019 do Fórum Econômico Mundial aponta que o Brasil ocupa o 85º lugar no ranking de qualidade da infraestrutura de transportes, entre 141 países. Essa posição reflete as dificuldades na modernização dos modais logísticos, comprometendo os esforços para reduzir a pegada de carbono. 

Cerca de 65% do transporte de cargas no Brasil é realizado por rodovias, e a maioria dos caminhões é abastecida por combustíveis fósseis. 

O governo brasileiro tenta diminuir as emissões dos transportes a partir da Lei do Combustível do Futuro, que entrou em vigor em outubro de 2024. Ela visa aumentar para 20% o índice de biodiesel — derivado de óleos vegetais — no diesel até 2030; esta mistura obrigatória está fixada em 15% para 2025. Enquanto isso, o Brasil enfrenta dificuldades na expansão da malha ferroviária, predominantemente utilizada para o transporte de minério de ferro.

O especialista João Victor Marques, do centro de pesquisa FGV Energia, considera que a lei é um passo importante para diminuir as emissões do país: “Há tempos não tínhamos uma política tão ambiciosa para o mercado de biocombustíveis. Sem dúvidas há melhorias na inserção de novas alternativas verdes. No geral, vejo que é uma política positiva para reduzir as emissões na matriz de transporte brasileiro”. 

Em 1989, o Conama instituiu um programa voltado ao controle da qualidade do ar no Brasil. O plano previa a criação de uma rede de monitoramento da poluição do ar, com equipamentos para medições, além de estratégias para enfrentar episódios críticos. Mas o monitoramento ainda não abrange todo o território nacional. O estado do Rio de Janeiro tem mais de 120 estações, seguido por São Paulo, com quase 80 pontos. No entanto, na região Norte, que abriga o bioma amazônico, não há nenhuma estação. 

“No Norte do Brasil e em alguns outros estados, não há monitoramento oficial; só o monitoramento que a gente chama de baixo custo”, disse Helen Sousa, pesquisadora do Instituto Energia e Meio Ambiente. 

Outro grande problema é que a qualidade do ar não é devidamente avaliada durante o processo de licenciamento de novas indústrias. “Muitas vezes, não se leva em consideração que a área já pode estar saturada com altas concentrações de poluentes”, disse Sousa. 

As emissões e os planos de descarbonização do Brasil provavelmente atrairão a atenção global este ano, com o país definido para sediar a cúpula climática COP30 em Belém do Pará. O Brasil foi um dos primeiros a submeter suas metas climáticas, as NDCs, como parte do Acordo de Paris – embora tenha recebido críticas de ambientalistas pelo baixo nível de ambição e pelos planos do país de aumentar a produção de petróleo e gás.



Por: Thiago Lima. Fonte: Dialogue.Earth.