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Estudo em Vinhedos Mostra a Vantagem de Preservar Floresta Nativa Próxima a Áreas Agrícolas


Agricultura: preservação das florestas nativas tem papel importante na promoção de práticas sustentáveis do uso da terra. 

Ao pesquisar região no interior paulista, pesquisadores observaram que, nos locais mais conservados, havia maior diversidade de aves e de funções ecológicas por elas desempenhadas. 

A maior diversidade de ambientes leva a um aumento na diversidade de aves em paisagens agrícolas. Essa é uma das principais conclusões de uma pesquisa conduzida em vinhedos de São Miguel Arcanjo, interior do Estado de São Paulo, com apoio da Fapesp. A região está entre as maiores produtoras da fruta, cultivada principalmente por pequenos agricultores, e próxima do maior maciço de Mata Atlântica do país, o Continuum Ecológico de Paranapiacaba

Áreas de matas contínuas como essa podem ser lar de diversas espécies de aves, que têm características ecológicas distintas, possibilitando uma maior variedade de funções ecossistêmicas no ambiente. Isso significa que, quando se perde uma espécie, perdem-se também as funções realizadas por ela. 

“Como as mudanças ambientais e a fragmentação das florestas afetam as espécies e suas funções ecossistêmicas está entre as principais questões que os pesquisadores têm buscado compreender nas últimas décadas”, afirma o professor Augusto Piratelli, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), que supervisionou a pesquisa. “Somente com estudos muito bem planejados e com coleta de dados de excelente qualidade é que poderemos responder a tais questões.” 

Além da UFSCar, o estudo envolveu cientistas da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e da Universidade de São Paulo (USP). O grupo recebeu financiamento da Fapesp por meio de sete projetos (13/50421-2; 20/01779-5; 21/06668-0; 21/08322-3; 21/08534-0; 21/10195-0; 21/10195-0). Os resultados foram divulgados na revista Biotropica

Metodologia

Para realizar a pesquisa, foram escolhidos 19 locais em paisagens agrícolas com vinhedos no município de São Miguel Arcanjo, próximo a Sorocaba. Os lugares foram cuidadosamente escolhidos para garantir que houvesse uma variação de ambientes com paisagens naturais e também modificadas pelo ser humano. 

Com métricas preestabelecidas, foi analisada a porcentagem de floresta que havia dentro de cada local de estudo, como uma forma de avaliar o grau de conservação. “Compreender como a quantidade de ambientes naturais e antrópicos e a variação dessas quantidades influenciam as espécies e suas funções nos agroecossistemas pode permitir a definição de estratégias de conservação e manejo muito mais eficientes”, diz Daniele Moreno, primeira autora do artigo. 

Para os pesquisadores, entender quais aves são encontradas nos vinhedos e também quais funções desempenham nesses sistemas agrícolas é muito importante. Segundo Piratelli, “cada espécie executa papéis distintos nos cultivos agrícolas e, muito provavelmente, paisagens com mais florestas e maior diversidade de ambientes devem manter mais funções. Passamos da etapa de simplesmente registrar as espécies que ocorrem nos ambientes e, agora, estamos quantificando suas contribuições para manter serviços e funções ecológicas”. 

Diversificar paisagens, manter a vegetação nativa

Os autores destacam quanto é importante preservar as florestas nativas nessas áreas agrícolas para manter a biodiversidade ao redor dos vinhedos. Além disso, “o estudo destaca a importância de considerar tanto a diversidade taxonômica como a funcional na avaliação dos impactos das mudanças na paisagem nas funções ecológicas realizadas pelas aves”, diz Milton Ribeiro, professor da Unesp de Rio Claro e coautor do estudo. 

Essa informação pode ajudar a criar políticas públicas que equilibrem a produção agrícola com a conservação da biodiversidade nas áreas rurais. “No geral, este estudo enfatiza a importância de compreender as relações complexas entre a heterogeneidade da paisagem, a biodiversidade e as funções ecológicas nos agroecossistemas para promover práticas sustentáveis de uso da terra que beneficiem os agricultores e o ambiente”, finaliza Ribeiro

O artigo Landscape heterogeneity increases bird functional diversity within Neotropical vineyards pode ser lido em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1111/btp.13328.



Fonte: Agência Fapesp. Com informações do Laboratório de Ecologia de Espacial e Conservação, o LEEC, da Unesp.

Por Que Alguns Cientistas Acreditam Que Vida na Terra É Mais Antiga do Que se Pensava?


Desenho de como vida poderia ter sido há 2,1 bilhões de anos, segundo teoria. 

Um grupo de cientistas disse ter encontrado novas evidências que amparam a teoria de que a vida complexa na Terra pode ter começado 1,5 bilhão de anos antes do que se imaginava. 

A equipe, que trabalhou no Gabão, disse ter encontrado evidências dentro de rochas que mostram haver condições ambientais para vida animal há 2,1 bilhão de anos. 

Mas eles dizem que os organismos estavam restritos a um mar dentro de um continente, não conseguiram se espalhar pelo planeta e acabaram desaparecendo. 

Essas ideias são muito distintas do consenso científico sobre o tema — e muitos cientistas não as aceitam como válidas. A maioria dos especialistas acredita que a vida animal começou há 635 milhões de anos. 

Os cientistas examinaram as rochas ao redor das formações para verificar se havia evidências de substâncias como oxigênio e fósforo, que ajudam a sustentar vida. 

O professor Ernest Chi Fru, da Universidade de Cardiff, trabalhou com uma equipe internacional de cientistas. 

Ele disse à BBC que, se sua teoria estiver correta, esses organismos seriam parecidos com bolor limoso — um organismo unicelular que se reproduz com esporos. 

Mas Graham Shields, professor da University College London, que não participou da pesquisa, disse que têm algumas dúvidas sobre o trabalho. 

"Eu não sou contra a ideia de que havia altos nutrientes há 2,1 bilhões de anos, mas não estou convencido de que isso poderia acarretar em diversificação para formação de vida complexa", diz ele, sugerindo que é preciso haver mais evidências. 

Chi Fru diz que seu trabalho ajuda a comprovar ideias sobre os processos de criação de vida na Terra. 

"Estamos dizendo: veja bem, há fósseis aqui, há oxigênio, isso estimulou o surgimento dos primeiros organismos vivos complexos", diz. 

"Nós vemos o mesmo processo que existia no período cambriano, há 635 milhões de anos — ela (a pesquisa) suporta essa ideia. Ela nos ajuda a entender em última instância de onde todos nós viemos." 

A primeira sinalização de que a vida complexa pode ter começado antes do que se imaginava veio há dez anos com a descoberta de algo chamado de formação de Francevilian

Chi Fru e seus colegas dizem que a formação é composta de fósseis que indicam evidências de um organismo que conseguia se mexer de lado a lado, por vontade própria. 

As descobertas não foram aceitas por todos os cientistas. 

Para encontrar mais evidências, Chi Fru e sua equipe analisaram segmentos de sedimentos que foram perfurados na rocha no Gabão

A composição química da rocha mostra evidências de que um "laboratório" para vida foi criado antes da primeira formação surgir. 

Eles acreditam que os altos níveis de oxigênio e fósforo foram feitos por duas placas continentais que se colidiram em baixo da água, criando atividade vulcânica. 

A colisão separou uma seção de água do resto dos oceanos, criando um "mar interior marinho raso rico em nutrientes." 

Chi Fru diz que esse ambiente protegido tinha condições de permitir a fotossíntese, gerando quantidades significativas de oxigênio na água. 

"Isso teria fornecido energia suficiente para promover crescimento em tamanho do corpo e comportamento mais complexo observado em organismos primitivos e simples como os achados em fósseis desse período", diz ele. 

Mas ele afirma que o ambiente isolado também levou ao desaparecimento desse tipo de vida, porque não havia novos nutrientes suficientes para servir de alimentos. 

O estudante de doutorado Elias Rugen, do Natural History Museum, de Londres, que não participou da pesquisa, disse que concorda com algumas das conclusões do estudo. Ele diz que é claro que "ciclos de carbono, nitrogênio, ferro e fósforo estavam fazendo algo um pouco sem precedentes nesse ponto da história da Terra". 

"Não há nada que diga que formas complexas de vida biológica não pudessem ter surgido e prosperado há 2 bilhões de anos", diz — mas ele ressaltou que são necessárias mais evidências para suportar essas teorias. 

As descobertas foram publicadas na revista científica Precambrian Research.



Fonte: BBC. Por: Georgina Rannard.

Cortinas de Fumaça do Urbanismo


Vila Carrão, São Paulo, em direção ao Centro da Penha / Crédito: Lucas Chiconi Balteiro.

Vivemos uma crise do urbanismo que envolve o conjunto social e político da nação, desleixado às desigualdades extremas entre o lançamento de produtos imobiliários de alto luxo em todas as regiões do país, e as chacinas em periferias urbanas. 

Já faz alguns anos que a palavra Urbanismo se popularizou nas redes sociais, seja pelo incremento das plataformas de comunicação e do acesso às novas gerações da profissão, seja porque o campo vem sendo disputado por diferentes agentes que se apropriam da palavra e dos seus variados usos mediante interesses econômicos, culturais e políticos. 

Por um lado, a palavra significa o estudo do ambiente urbano e suas complexidades entre os temas da moradia, da mobilidade, do transporte, da história urbana, do patrimônio cultural, da recuperação e usufruto dos sistemas ambientais, dos espaços públicos, das dinâmicas imobiliárias, entre outras variáveis. Por outro, o termo se tornou ferramenta do poder privado, sobretudo do setor imobiliário, para disputar seus interesses e possíveis alianças com os interesses públicos. Em vez de sinalizar a qualidade de um futuro empreendimento, agora se fala no quanto ele irá promover em benefícios para a cidade. Das disputas mais calorosas em torno das cidades está a regulação do mercado privado pelo Estado, com diretrizes técnicas que buscam ordenar o crescimento e o desenvolvimento do território como forma de extração de recursos para possibilitar justiça socioespacial e ambiental. Afinal, estamos no país dos Extremos, título do livro do economista Pedro Fernando Nery, lançado recentemente. Se algo que o “Urbanismo” precisa efetivar é a capacidade de resiliência dos territórios e principalmente combater as desigualdades extremas que perpassam renda, classe, raça, gênero e outras várias camadas de cunho sociocultural, político e econômico que dão forma à sociedade. 

A regulação ao setor privado da construção, que direciona as possibilidades de formas urbanas a serem produzidas, vem sendo duramente criticada e culpabilizada por “todos” os problemas das cidades brasileiras. Parece cômico, mas realmente existe uma argumentação que trata os afastamentos dos prédios em relação às ruas como os causadores da desigualdade e da violência contra pobres e negros, ou mesmo que a produção de casas em série pelo programa Minha Casa, Minha Vida teria arruinado as cidades brasileiras. Está claro que as leis urbanísticas, como Planos Diretores e Zoneamentos, têm seus pesos e poderes de influência no ordenamento territorial, sobretudo no aspecto das possibilidades de uso e ocupação do solo. Junto com o Código de Obras, direcionam tipologias de edificações e tornam-se basilares aos projetos de arquitetura e engenharia, que inclusive devem ser criticados pelas suas produções. Entretanto, não sejamos ingênuos em relação às práticas ilícitas que também se fazem presentes na sociedade e na produção da urbanidade. Engana-se quem pensa que estão restritas às favelas e loteamentos precários nas bordas metropolitanas: muitos bairros e condomínios fechados voltados às elites são frutos de grilagens de terra e processos ilegais de construção. Sem falar quando esses espaços criam gestões de poder paralelo. Além disso, a participação popular no processo de elaboração dessas leis é bastante desigual, onde setores privados vinculados aos grupos de maior poder econômico e político se fazem presentes em momentos particulares junto ao poder público, em que o restante da população não tem chances de contribuição ou qualquer acesso. 

Outra distorção está no sentido de evidência científica, com o objetivo de desmanchar possíveis consensos que acabem por atravancar interesses particulares e números que os beneficiem na produção do espaço. Em outras palavras, andam associando “evidências” àquilo que pode somente ser provado por meio de cálculos do quanto se pode ou não construir, do quanto se pode ou não adensar construtivamente e demograficamente, ou seja, o quanto o mercado pode ou não elevar a altura de um prédio e suas unidades residenciais e comerciais. Adensar é uma ação, um verbo, assim como preservar, construir, verticalizar, tombar, demolir, requalificar, expandir, zonear e planejar. Verbos, não adjetivos. Constituem ação e não qualidade. No imaginário popular, quando pensamos em áreas residenciais dos Estados Unidos, nos remetemos aos subúrbios de grandes casas de classes médias com jardim frontal, ou mesmo aos subúrbios de elite de Los Angeles, como Beverly Hills e Calabasas. Em alguns casos lembramos de Manhattan, mais especificamente do Upper East Side, onde a elite nova iorquina vive e se manifesta socialmente em prédios com vista para o Central Park. São exemplos recorrentes em aulas de urbanismo que buscam demonstrar as diferenças de sociabilidade e infraestrutura entre bairros dispersos e densos, no que é consenso no campo, de que áreas urbanas mais densas costumam ter maior eficiência no aproveitamento das infraestruturas públicas. 

Em São Paulo, a comparação sugerida seria o Jardim Europa versus Higienópolis, enquanto no Rio de Janeiro estaria entre os bairros da Barra da Tijuca e de Ipanema. Contudo, quando o debate foi importado de contextos muito distintos do Brasil, nossa realidade complexa passou a ser achatada em discussões que se resumem ao formato dos prédios e às oportunidades econômicas voltadas aos interesses privados, ou mesmo a um ringue entre casas e prédios que simplifica os tecidos urbanos e ignora as desigualdades entre as “pessoas”. Me pergunto como uma família pobre que trabalha com entulho e sucata na frente de sua casa autoconstruída e precária poderia acessar e viver em um apartamento produzido pelo mercado imobiliário privado, com seu sistema de vigilância em guaritas e comércio e serviços voltados aos moradores abonados. É esse o mercado que irá promover justiça socioespacial por meio de habitação social aos brasileiros pobres? 

Vivemos uma crise do urbanismo que envolve o conjunto social e político da nação, desleixado às desigualdades extremas entre o lançamento de produtos imobiliários de alto luxo em todas as regiões do país, sobretudo nos interiores, e as chacinas em periferias urbanas que desafiam o que deveria ser prioritário nas discussões sobre segurança pública. A crise é também do status quo que sempre dominou a frente das políticas públicas urbanas, em setores acadêmicos pouco populares e acessíveis pelas massas da sociedade. Pior, que são contraditórios ao defender justiça socioespacial e pouco abertos ao enfrentamento dos guetos de mansões parasitados no meio da metrópole paulistana, com apoio da legislação, que chamamos de bairros-jardins. Nesse meio-tempo, sobrados de classes médias em bairros mistos são colocados como inimigos da “boa urbanidade”, como o motivo principal pela existência das periferias enquanto lugares de exclusão e vulnerabilidade social. Além disso, é necessário pensarmos fora do eixo Rio-São Paulo, onde classes médias são bastante reduzidas em termos gerais, como Salvador e Belém, metrópoles onde parte significativa da população vive em assentamentos precários, como favelas, e o abismo entre os mais ricos e os mais pobres tende a ser ainda maior. Se de um lado a crise afeta a hegemonia, por outro lado a crise é de bom senso ao desvirtuar sentidos e significados das políticas públicas e sua importância no desenvolvimento do país, frequentemente reduzidas a um malabarismo cínico do que é ou não fazer urbanismo. 

Que as novas gerações sejam capazes de trilhar caminhos mais transparentes, responsáveis e assertivos para o campo e para a sociedade brasileira, disputando de maneira contundente as instituições de classe profissional, as universidades e os espaços de poder dos seus campos disciplinares. Não dá pra defender arranha-céu de 500 metros de altura em Balneário Camboriú como ferramenta fundamental ao país dos Extremos, sobretudo na mesma região que foi assolada por inundações que arrasaram com tantas vidas no Rio Grande do Sul. Dito isso, não poderia deixar de referenciar Joice Berth, arquiteta, urbanista e psicanalista paulistana do Mandaqui, autora do livro Se a Cidade Fosse Nossa, onde lança luz sobre racismos, falocentrismos e opressões nas cidades. Em outras palavras, Berth demonstra como tais violências são centrais nas dinâmicas socioeconômicas dos espaços urbanos e não meras subjetividades como costumam ser tratadas – por não serem apenas evidenciadas por cálculos matemáticos que tentam simplificar as complexidades inerentes às sociedades e às cidades. Aliás, a ideia de uma cidade resumida em um Centro que demanda adensamento populacional e investimentos de cunho privado, a fim de trazer as periferias, por quais é rodeado, é outra simplificação. 

É uma batalha no campo científico, onde ciências humanas são constantemente colocadas em posição não científica, como se evidências estivessem apenas no campo das ciências exatas, dos dados quantitativos. Muito bem nos lembra a matemática Tatiana Roque, professora da UFRJ, no seu último livro lançado, O Dia em Que Voltamos de Marte: Uma História da Ciência e do Poder Com Pistas Para um Novo Presente: há uma crise dos experts e das ciências que influenciam em políticas públicas. A professora usa com frequência o exemplo da pandemia de Covid-19 e o negacionismo contra as vacinas no campo da saúde pública, mas o mesmo é válido para o que vem ocorrendo com as políticas públicas urbanas, ambientais e territoriais, onde as influências da arquitetura e do urbanismo, do planejamento territorial, do direito urbanístico, da geografia, da sociologia, da antropologia e outras áreas humanas e das ciências sociais aplicadas são colocadas de modo subjetivo para não atrapalharem os cálculos do “progresso”. Nada mais ideológico do que atribuir qualidade coletiva a uma ação (de interesse) individual ou privado, materializada nos espaços construídos, destruídos ou transformados nas cidades. 


Fonte: Le Monde Diplomatique Brasil. Por: Lucas Chiconi Balteiro — arquiteto e urbanista, mestrando em História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo na FAU/USP e membro dos grupos de pesquisa “Cultura, Arquitetura e Cidade na América Latina” (CACAL, FAU/USP) e “Cidade, Arquitetura e Preservação em Perspectiva Histórica” (CAPPH, UNIFESP).

Fungos Estão Se Adaptando ao Calor Corporal, diz estudo

Fungos estão se adaptando ao calor corporal e isso pode ter relação com aquecimento global. 

Milhões de espécies de fungos estão presentes no ar, no entanto, apenas cerca de 20 podem causar infecções em seres humanos. Isso ocorre, pois o sistema imunológico é muito hábil na proteção contra esse grupo de patógenos. Além disso, o corpo humano é muito quente para a sobrevivência da maioria das espécies de fungos. 

Mas um novo estudo descobriu que alguns fungos estão evoluindo para se tornarem capazes de infectar humanos, e essa evolução pode estar relacionada à mudança climática. "O perigo e a importância de fungos têm sido seriamente subestimados", escreveram os autores no estudo publicado na revista Nature Microbiology em meados de junho. 

Há também indicações de que o aumento das temperaturas esteja permitindo que os fungos sofram mutações e se tornem resistentes a antifúngicos. 

Os pesquisadores começaram vasculhando os registros de infecções fúngicas de 98 hospitais na China, entre 2009 e 2019. Eles encontraram dois pacientes que haviam sido infectados por um grupo de fungos que, até onde se sabe, nunca haviam causado doenças em humanos. 

Os fungos foram isolados em laboratório e os pesquisadores descobriram que eles eram capazes de infectar camundongos que estavam com o sistema imunológico comprometido, imitando o que poderia acontecer em pacientes imunocomprometidos. 

Devido à temperatura corporal de 37°C – muito elevada para a maioria das espécies de fungos, os mamíferos são protegidos contra esses patógenos. Mas entre os novos registros, os pesquisadores descobriram que as espécies de fungos R. fluvialis e R. nylandii toleram bem a alta temperatura corporal. 

Além disso, a temperatura de 37°C aumentou a taxa de mutações nas colônias de fungos em comparação com temperaturas mais frias de 25°C. Como resultado, os fungos tornaram-se resistentes a medicamentos antifúngicos. 

"Esse estudo mostra que o mesmo mecanismo pode ocorrer em outros organismos que não causam doenças, o que significa que eles podem se adaptar para causar doenças em humanos", explica Jatin Vyas, médico especialista em fungos da Faculdade de Medicina de Harvard, EUA

"Podemos ver um cenário apocalíptico. Não vai ser como a série The Last of Us, mas significa que novos fungos podem causar doenças infecciosas graves. E temos muito poucos medicamentos para ajudar", completa Vyas, que não participou do estudo. 

Aquecimento global provocou uma evolução dos fungos? 

Segundo os autores do estudo, o aquecimento global tem levado os fungos a desenvolver resistência a medicamentos e virulência – a capacidade de causar doenças. 

"Essa é uma conclusão indireta derivada das observações de que a tolerância ao calor é uma virulência conhecida", diz Toni Gabaldón, biólogo evolucionário do Instituto de Pesquisa em Biomedicina de Barcelona, na Espanha

Outros estudos mostraram que algumas espécies de fungos podem crescer em temperaturas mais altas do que podiam há várias décadas. No entanto, "falta provas diretas de que essas duas observações estão relacionadas e são necessárias mais pesquisas", acrescenta Gabaldón

Vyas, por sua vez, não está convencido de que as mudanças climáticas sejam o motivo da evolução dos fungos em temperaturas corporais mais altas no estudo. "Uma mudança repentina de 25 para 37 °C não é o que eu chamaria de resultado do aquecimento global. A temperatura na bacia amazônica aumentou 1°C na última década, o que teve um efeito profundo na ecologia", destaca. 

Os cientistas identificaram recentemente que alguns patógenos fúngicos, incluindo Candida auris, surgiram devido ao aumento da temperatura do solo em todo o mundo. Vyas acredita que isso provavelmente se deve ao aquecimento global. 

Qual é o risco de disseminação de fungos resistentes a medicamentos? 

De acordo com Vyas, há um risco de fungos resistentes a medicamentos se espalharem pelo mundo, já que foram detectados na Espanha, em Portugal e no Canadá

"Existe o risco de que espécies resistentes a medicamentos se espalhem pelo mundo", afirma Vyas. "Estamos começando a ficar nervosos com o que estamos vendo. Quando pensamos nos bilhões de outros organismos que habitam a Terra, a grande maioria é completamente resistente aos medicamentos antifúngicos." 

As infecções fúngicas já causam cerca de 2,5 milhões de mortes por ano. 

"A resistência aos antifúngicos é um problema grave e provavelmente aumentará, pois, em comparação com os antibióticos, temos apenas três famílias principais de medicamentos antifúngicos", conta Gabaldón

A dificuldade é que os fungos são organismos eucarióticos, assim como os mamíferos. Isso significa que o desenvolvimento de qualquer novo medicamento pode resultar em efeitos colaterais para os humanos, que, por sua vez, também precisam ser tratados. Pode-se esperar um longo processo até que os medicamentos possam ser usados em humanos. 

Mas Vyas vê um ponto positivo nas más notícias. "Estudos como esse nos preparam para organismos patogênicos", explica. "Estamos começando a entender como os fungos estão se adaptando a partir desses casos raros, como na China. Assim, poderemos encontrar mecanismos para nos proteger no futuro."


Fonte: Climatempo. Por: Josélia Pegorim.

Guia Oferece Passo a Passo Para Planejar e Implementar Projetos de Restauração Florestal


A apicultura está entre as diversas atividades que podem ser incluídas em um projeto de restauração na escala da paisagem (foto: WRI Índia). 

Em todo o mundo, práticas não sustentáveis de gestão dos solos, o aumento da fragmentação, a degradação das florestas e de outros ecossistemas e a monocultura estão colocando em risco a natureza, o clima e os meios de subsistência. À medida que o solo se degrada em decorrência de práticas agrícolas e de pastagem que agridem o meio ambiente, as comunidades encontram cada vez mais dificuldade para produzir alimentos suficientes. Tudo isso tem um impacto profundo na segurança nutricional, principalmente para os grupos mais vulneráveis. E, em paralelo, a perda de biodiversidade alcança taxas sem precedentes. 

Estima-se que mais de metade do PIB mundial – US$ 44 bilhões – depende da natureza e dos serviços que ela fornece. A perda de natureza e biodiversidade, portanto, não só prejudica a economia como põe em risco o acesso ao ar, solo e água limpos, necessários para uma boa alimentação e para a manutenção da saúde. 

Uma abordagem de restauração na escala das paisagens pode aumentar a produtividade e o rendimento na agricultura, tornar a terra mais resiliente a fenômenos climáticos extremos e aumentar a biodiversidade, além de absorver o dióxido de carbono que prejudica o planeta. 

Uma abordagem de restauração como essa funciona por meio de mudanças na gestão dos solos – como aumentar a diversidade de culturas ou evitar o desmatamento de árvores e da vegetação em geral, a fim de melhorar as condições do ecossistema local e tornar o solo mais fértil. A restauração é possível por meio de práticas como agroflorestas (cultivo de árvores entre as culturas), sistemas silvopastoris (cultivo de árvores em pastagens), plantio de árvores em áreas florestais degradadas e regeneração natural. 

À medida que essas soluções se tornam mais atrativas a investimentos dos setores público e privado, os projetos de restauração precisam prever mais fiscalização e garantir a capacidade de sobrevivência e sustentabilidade das soluções, além de gerar impactos capazes de atrair novos investimentos. Ou seja, precisam ser bem estruturados, priorizando investimentos ecológicos e liderados pela comunidade local e que gerem retornos financeiros para investidores, gestores e proprietários de terras. Isso porque, cada vez mais, as empresas que investem em projetos de restauração exigem práticas de prestação de contas e comprovações de devida diligência para os seus investimentos. 

Para ajudar esses projetos e garantir mais investimentos, o WRI (World Resources Institute) e seus parceiros criaram o Restoration Launchpad Guidebook, um guia com o passo a passo dos processos de planejamento e implementação de projetos de restauração na escala das paisagens, a fim de contribuir para o planejamento, desenvolvimento, implementação e monitoramento dos projetos. 

O guia fornece uma estrutura para aliar metas de conservação e desenvolvimento em uma mesma paisagem – com foco nas pessoas e reunindo as principais partes interessadas para solucionar desafios como degradação da terra, conservação dos recursos naturais e melhora dos rendimentos e meios de subsistência locais. 

Quando realizada de forma sistemática tanto na etapa de planejamento quanto de implementação, a restauração na escala das paisagens pode permitir uma gestão adaptativa com foco nas metas de conservação e, ao mesmo tempo, de redução da pobreza. 

O guia lançado pelo WRI propõe uma estrutura para que planejadores e demais profissionais da área possam planejar projetos de restauração do início ao fim, integrando boas práticas recomendadas por diversos especialistas em restauração, desde desenvolvedores de projetos até financiadores e implementadores. Se necessário, o guia também pode ser utilizado em projetos de restauração já em andamento, para preencher possíveis lacunas e reavaliar questões sociais, econômicas, ecológicas e financeiras. 

5 etapas essenciais de projetos de restauração 

O guia identifica cinco etapas essenciais aos projetos de restauração: escopo, planejamento, financiamento, implementação e monitoramento. Cada uma explora aspectos fundamentais para conduzir a restauração de forma eficaz, junto a um checklist que planejadores e profissionais podem usar para acompanhar o avanço dos projetos e garantir que todos os tópicos foram considerados. Esses checklists podem ser usados, adaptados e aprimorados para apoiar o andamento dos projetos de restauração na prática e ajudar a atrair financiamento para a natureza e as comunidades. 

1) Escopo

A definição do escopo exige uma avaliação do contexto ecológico, social, econômico, financeiro e regulatório de qualquer possível local para o projeto, a fim de determinar as áreas onde a restauração é mais viável. A identificação da paisagem e das metas para a área pode variar se o projeto for conduzido por uma empresa implementadora ou por uma comunidade local, por exemplo. As principais ações necessárias incluem: 

• Definir metas de restauração 
• Mapear oportunidades de restauração e priorizar paisagens e intervenções 
• Identificar as principais condições facilitadoras e barreiras 
• Analisar as compensações e desenvolver uma estratégia para mitigar os riscos 
• Selecionar uma área para o projeto 
• Determinar uma proposta de valor

2) Planejamento

Planejar um projeto eficaz exige que todos os processos internos e externos sejam conceituados, definidos e organizados pelos profissionais que também estarão envolvidos durante a implementação. As principais ações incluem: 

• Definir intervenções de restauração 
• Gerenciar as principais atividades 
• Assegurar os recursos 
• Envolver atores-chave e estabelecer parcerias 
• Adotar protocolos, padrões e certificações

3) Financiamento

O financiamento é um elemento fundamental desde o conceito até a implementação dos projetos. É preciso garantir um orçamento efetivo, alocação de recursos e diferentes opções de financiamento. Os principais aspectos que precisam ser considerados são: 

• Fontes de receita 
• Custos 
• Opções de financiamento 
• Financiadores

4) Implementação

A implementação do projeto é o processo de realizar intervenções de restauração na prática, trabalhando com proprietários de terras e comunidades para corrigir e preparar o local. Envolve intervenções como plantio, regeneração e cultivo de árvores, mitigação de riscos e o monitoramento dos avanços nas fases iniciais, quando são feitos testes de viabilidade das espécies. As principais considerações em relação a essa etapa incluem: 

• Preparar o local e os recursos necessários 
• Plantar, regenerar e cultivar 
• Fazer a manutenção da área e dos recursos necessários

5) Monitoramento

O monitoramento é baseado no processo de implementação como um todo. Nessa etapa, o desempenho de um projeto é avaliado em termos de parâmetros ecológicos, sociais e econômicos, criando oportunidades para uma gestão adaptativa e embasando a tomada de decisões para o projeto avançar. As principais considerações relacionadas ao monitoramento são: 

• Desempenho 
• Processos adaptativos de aprendizado e gestão 
• Dimensionamento e saída 

Mulheres cultivam mudas para melhorar o crescimento e a qualidade dos cultivos na África. Uma abordagem de restauração na escala da paisagem funciona por meio de práticas de gestão do uso da terra, como aumentar a diversidade de culturas ou evitar o desmatamento de árvores e da vegetação, a fim de melhorar as condições do ecossistema e tornar o solo mais fértil (foto: Arcos Network)

Escopo do guia Restoration Launchpad 

O guia Restoration Launchpad apresenta abordagens, etapas e princípios de ampla aplicabilidade. Encorajamos planejadores e demais profissionais da área a adotar e adaptar o conteúdo do guia a diferentes contextos e, com isso, desenvolver projetos de restauração ecologicamente sustentáveis, socialmente inclusivos e economicamente viáveis para estimular uma economia da restauração. 

À medida que os esforços para conter a perda de biodiversidade crescem em todo o mundo por meio de ações de larga escala, projetos individuais de restauração podem contribuir com esses objetivos. O Restoration Lauchpad complementa os objetivos de iniciativas como a AFR100, da África, a Iniciativa 20x20 e o Desafio de Bonn, contribuindo para que a restauração aconteça nos locais certos, com os usos certos e com as espécies certas.


Fonte: WRI Brasil.

Cientistas Desenvolvem Célula Sintética Capaz de Realizar Diferentes Funções


Colônia formada pelas células mínimas desenvolvidas na pesquisa. 
Foto: Nacyra Assad Garcia/JCVI.

Imagine uma bactéria que, ao invés de fazer mal, é capaz de percorrer o organismo entregando fármacos para combater doenças como o câncer, diretamente nas células afetadas. Ou então que possa “comer” o plástico nos oceanos, resolvendo assim um dos principais problemas ambientais da atualidade. A pesquisa desse tipo de microrganismo acaba de dar um passo importante, no Brasil. A pesquisadora Daniela Bittencourt, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (DF), participa de estudos no País com a JCVI-syn3.A, uma derivada da JCVI-syn3.0, célula de menor genoma já obtida, capaz de crescer em meios de laboratório, desenvolvida pelo J. Craig Venter Institute (JCVI). 

“Mostramos [em artigo científico] como a JCVI-syn3.A é um organismo versátil e robusto, que pode ser usado para investigar interações entre bactérias e células de mamíferos”, conta a pesquisadora, ao informar que o processo de desenvolvimento da célula, desde a JCVI-syn1.0, foi feito pelo J. Craig Venter Institute, no qual ela atuou como cientista visitante, entre 2019 e 2021. Cientistas do JCVI assinam com ela o artigo. 

“A JCVI-syn3.A tem 19 genes a mais do que a JCVI-syn3.0. Esses genes foram inseridos de volta para deixar a célula com morfologia e processo de divisão mais próximos ao natural, facilitando assim sua manipulação em laboratório”, explica. 

Célula mínima

O trabalho envolve o conceito de célula mínima, a qual carrega um genoma 100% sintético e possui em seu código genético apenas o necessário para mantê-la viva e se multiplicar em ambiente controlado. No caso da linhagem JCVI-syn, foi utilizada como base genética o genoma da bactéria Mycoplasma mycoides, subespécie capri, uma espécie patogênica que causa pneumonia em caprinos. 

“As células Mycoplasma já são consideradas células mínimas da natureza. Por isso, praticamente todas elas têm que viver dentro do hospedeiro, pois não possuem o maquinário genético para produzir os nutrientes necessários para sobreviver”, explica a pesquisadora. 

Contruíndo uma célula sintética

Como a célula Mycoplasma já possui um genoma pequeno, os cientistas do JCVI a utilizaram como modelo para sintetizar todo o genoma dela em laboratório. Nascia a JCVI-syn1.0, da qual foram retirados apenas alguns genes que já eram conhecidos por sua patogenicidade, transformando-a em uma célula mais inofensiva. Depois de sintetizar esse genoma, os pesquisadores conseguiram introduzi-lo dentro de uma outra célula, de uma espécie prima, a Mycoplasma capricolum, que ficou com dois genomas: o natural e o sintético. 

“Quando essa célula se dividiu, o genoma sintético foi para um lado e o natural para o outro. Só que o genoma sintético possui um gene que confere resistência ao antibiótico tetraciclina. Foi colocado o antibiótico no meio e então a célula filha que recebeu o genoma natural morreu e apenas a com o genoma sintético sobreviveu. Assim, criou-se a primeira célula com genoma 100% sintético”, explica Bittencourt

A partir dessa célula, os cientistas fizeram um estudo para identificar os genes essenciais à vida e retiraram os outros, em um processo de minimização do genoma, até chegarem à JCVI-syn3.0. “Ela é muito usada para estudar funções celulares, entender o que é necessário para a vida, ou seja, os componentes genéticos mínimos da vida”, destaca a pesquisadora da Embrapa

A biologia sintética

De acordo com Bittencourt, a chave para a tecnologia está na biologia sintética. O objetivo a longo prazo é aprender as metodologias de síntese de genoma e de desenvolvimento de células com genoma sintético, a fim de produzir bactérias e outros microrganismos que possam ser usados como bioinsumos. 

“É possível usar o conhecimento da biologia a nosso favor. Ou seja: pegar todos os mecanismos biológicos que conhecemos e sintetizar as partes genéticas responsáveis por eles para construir um organismo com uma função específica. Daí o termo biologia sintética”, explica. 

Pode-se, por exemplo, criar uma bactéria capaz de fixar no solo os nutrientes necessários para o desenvolvimento máximo de uma determinada cultivar, ou que possa servir de biossensor no caso de contaminação da água. “No futuro, esse conhecimento também pode ser usado no desenvolvimento de uma vacina, ou de uma célula que percorra o organismo humano carreando genes de interesse para combater um câncer”, afirma a pesquisadora. 

Os trabalhos no Brasil

As pesquisas com a linhagem JCVI-syn no Brasil estão sendo desenvolvidas pelo Laboratório de Biologia Sintética da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, no âmbito do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Biologia Sintética (INCT BioSyn), liderado pelo pesquisador Elibio Rech, em parceria com o J. Craig Venter Institute, que cedeu as células mínimas para o estudo. “O INCT BioSyn inseriu a C&T do Brasil no mapa mundial da biologia sintética”, explica Daniela

“Estamos injetando a JCVI-syn3A, uma célula derivada da JCVI-syn3.0, em cabras para ver como elas vão responder à presença dessas bactérias in vivo, já que todos os estudos feitos até agora foram in vitro”, conta. Objetivo é descobrir formas de tratamento específicas para a pneumonia causada pela Mycoplasma mycoides em cabras, e verificar como vai ser a atuação da célula mínima. “Se ela realmente for inerte, já prova que pode ser usada como veículo para desenvolver novos fármacos, inclusive, para seres humanos e outras espécies animais”, adianta a pesquisadora. Essa etapa da pesquisa está sendo desenvolvida em parceria com a Universidade Federal da Bahia (UFBA). 

Ferramenta

Em outra frente da pesquisa, está sendo testada a interação da JCVI-syn3A com os neutrófilos humanos – o tipo leucocitário mais abundante na circulação, que constituem a primeira linha de reconhecimento e defesa contra agentes infecciosos no tecido. A boa notícia é que, até o momento, a célula mínima não provocou nenhuma reação desse mecanismo de defesa, indicando que, a princípio, ela é inerte ao sistema imunológico. “Esse fator é crucial para o desenvolvimento de vacinas e outras aplicações médicas, como a entrega de fármacos no organismo”, assinala Daniela.

“O mais importante é que conseguimos identificar alguns genes que têm relação com a patogenicidade da Mycoplasma mycoides. A partir disso, podemos utilizar a engenharia genética para transformá-la em uma ferramenta com múltiplas funções”, resume a pesquisadora.


Fonte: Embrapa. Por: Eduardo Pinho.

Parques Ambientais São a Linha de Frente Para a Elaboração de Medidas de Conservação Ambiental


Parque Estadual Marinho da Pedra da Risca do Meio – Foto: Comunicação Sema. 

Com mais de 70% da terra sofrendo interferência humana, Unidades de Conservação se tornam áreas ainda mais importantes, avalia Ana Lúcia Brandimarte. Pesquisadores observaram 14 associações entre esponjas e serpentes do mar na costa do Ceará. As interações contribuem para a reciclagem de matéria orgânica dos oceanos e para a formação e manutenção do meio ambiente. A observação da natureza é uma atividade essencial para os humanos. Entender a dinâmica de um ecossistema, as relações ecológicas dos diferentes agentes que o compõem, seus mecanismos de defesa e toda sua atividade quando se encontra em um estado saudável permitem uma melhor teorização de como aquele ecossistema funciona e levam, consequentemente, à elaboração de medidas mais embasadas para proteger esses espaços. 

Acontece que áreas naturais em estado saudável, sem interferência humana e degradação significativa, são cada vez mais raras no mundo. Pesquisadores da Universidade de Queensland, na Austrália, e da Sociedade para a Conservação da Vida Silvestre desenvolveram um mapa global de áreas sem interferência humana. Hoje, mais de 70% da terra (excluindo a Antártida) e 80% do oceano foram modificados por atividades humanas. Essa interferência antrópica torna ainda mais importante o papel dos parques ambientais para a sociedade científica e geral. Sete das 14 interações que foram observadas entre esponjas e serpentes do mar, mencionadas anteriormente, foram vistas em áreas de conservação da biodiversidade: o Parque Estadual Marinho da Pedra da Risca do Meio e o Canal das Arabaianas, ambos em Fortaleza

Parques ecológicos são unidades de conservação (UC) destinadas ao uso sustentável. O objetivo principal é conservar amostras dos ecossistemas naturais. As unidades propiciam a recuperação dos recursos hídricos e recuperação de áreas degradadas, promovendo sua revegetação com espécies nativas. O monitoramento ambiental dessas áreas fornece dados importantes sobre um ecossistema saudável e também sobre o processo de regeneração desses locais. Além disso, por serem áreas de domínio público, atividades de lazer e recreação da população em contato harmônico com a natureza são estimuladas, promovendo uma oportunidade de ampliar o acesso à educação ambiental. 

Compreender para proteger

A professora Ana Lúcia Brandimarte, do Instituto de Biologia da USP, é especialista em ecossistemas de águas continentais. Ela trabalha no monitoramento da qualidade da água no parque estadual Serra da Cantareira, um exemplo de UC mais próximo da realidade paulistana. Inaugurado em 1962, o parque é uma área remanescente da Mata Atlântica e possui uma das maiores áreas de mata tropical em regiões metropolitanas do mundo. Tanto a fauna quanto a flora do parque abrigam espécies em extinção, como o bugio, o gato-do-mato, a jaguatirica, o macuco, o gavião-pomba, o jacuguaçu e o bacurau-tesoura-grande. Entre as plantas, estão a imbuia, a canela-preta e a canela-sassafrás. 

“Só podemos conservar o que entendemos. É necessário compreender a estrutura e o funcionamento do que queremos proteger. Uma vez que a gente conhece essas informações, podemos pensar em medidas de recuperação ou mesmo restauração. No Parque da Cantareira, por exemplo, foi possível perceber a diferença entre um curso de água com e sem interferência humana em detalhes mais profundos”, explica. 

A professora e sua equipe analisaram cerca de 30 nascentes de água da região, coletando dados sobre a composição química da água, variáveis físicas, compostos orgânicos presentes e as interações da biota local com corpos d’água saudáveis. “Observamos características muito importantes: altas concentrações de oxigênio dissolvido na água, baixa concentração de nutrientes, desfavorecendo o crescimento de algas e favorecendo o equilíbrio da biota. Mapeamos também uma série de insetos e animais de certas denominações taxonômicas que se comportam como indicadores da saúde desses rios. A presença deles indica uma boa condição da água naquela região. Da mesma forma, a presença de outras espécies se mostraram indicadores de insalubridade”, elucida. 

Essa análise funciona como uma fotografia de referência. Com ela em mãos, os cientistas têm a imagem exata de como se parece o ambiente saudável, antes das interferências humanas. Isso entrega aos pesquisadores um norte no trabalho de encontrar caminhos para a restauração dessa situação de referência. “No caso do Parque da Cantareira, o que precisamos agora é fazer com que os cursos d’água ainda degradados cheguem nessa situação de referência que nós descobrimos”, conta. 

“Antes, partíamos do princípio de que, se a vegetação está conservada, então automaticamente os corpos d’água estão protegidos e a qualidade da água vai estar boa. No entanto, observamos que alguns dos riachos do parque, mesmo protegidos, ainda não estão em condições ideais observadas. Para entender o porquê, é necessário considerar aspectos relacionados ao controle do uso e ocupação do solo no entorno do parque e as alterações na biota. Muitas vezes, atividades externas ao parque terminam influenciando o ambiente dentro dele, ainda que ele esteja em uma área protegida. Se tratando de uma das maiores áreas ambientais urbanas do mundo, esses dados e processos de restauração são muito importantes”, finaliza.


Fonte: Jornal da USP. Por: Regis Ramos.

Geração de Lixo no Mundo Pode Chegar a 3,8 bi de Toneladas em 2050


Caso não haja mudança nos padrões de produção, consumo e descarte de materiais, a geração de resíduos sólidos domiciliar no mundo deve crescer 80% entre 2020 e 2050, passando de 2,1 bilhões de toneladas ao ano para 3,8 bilhões. 

Cenário considerado promissor é manter a produção de resíduos em 2 toneladas por ano, neste mesmo prazo, apesar do aumento populacional e melhora do poder aquisitivo mundial. 

Os dados são do relatório Global Waste Management Outlook 2024 (GWMO 2024), lançado durante a Assembleia das Nações Unidas para o Ambiente (em 28/02/2024), em Nairóbi, capital do Quênia. O documento foi desenvolvido pela International Solid Waste Association (ISWA) e pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). 

Relatório

O presidente da ISWA, Carlos Silva Filho, um dos autores do relatório, ressaltou que o mundo continua em uma tendência de aumento da produção de resíduos sólidos. “Ainda temos cerca de 40% desses resíduos vão parar em locais inadequados, tipo lixão e queima a céu aberto. Essa é uma tendência muito preocupante”, avaliou. 

Se tal quadro não for revertido, ele explica que pode haver impactos negativos no clima, com mais emissões de gases de efeito estufa, principalmente metano; na biodiversidade, com maior exploração de recursos naturais e prejuízos para flora e fauna; e na saúde humana, com maior poluição e impactos direto na qualidade do ar, água e solo. 

De acordo com o Panorama dos Resíduos Sólidos 2022, foram gerados no Brasil cerca de 80 milhões de toneladas de resíduos sólidos domiciliares, das quais 76 milhões de toneladas foram coletadas, totalizando uma cobertura de coleta de 93%, mesma média apontada para a América do Sul no relatório. No entanto, 40% dos resíduos coletados no país, cerca de 29,7 milhões de toneladas, ainda seguem para destinos inadequados - lixões e aterros controlados. 

Segundo o Atlas Global, no mundo, 38% dos resíduos acabam em destinos inadequados. Na América do Sul, esse percentual é de 34%, o que, segundo o ISWA, permite constatar que o Brasil está em situação deficitária em relação à média global e à média do continente. 

Silva Filho apontou ainda que os índices de aproveitamento dos resíduos são bastante limitados no país e no mundo. Segundo o relatório, enquanto a média global é de 19% e a do continente Sul-americano de 6%, o índice de reciclagem de resíduos sólidos urbanos no Brasil varia em torno de 3 a 4% e está estagnado há mais de uma década. 

Brasil

No Brasil, o levantamento revelou que, até 2050, a produção de resíduos deve crescer mais de 50% e poderá alcançar 120 milhões de toneladas por ano. Segundo o instituto, o número demonstra que o país carece de ações urgentes. 

“O relatório mostra que o país ainda está bastante deficiente na gestão de resíduos. Em termos de aumento e de crescimento da geração, o Brasil está seguindo a mesma linha do mundo, com esse crescimento acelerado. Mas em termos de aproveitamento do resíduo, nós estamos muito atrasados”, avaliou Silva Filho

A publicação aponta ainda que cerca de 2,7 bilhões de pessoas em todo o mundo não têm acesso aos serviços básicos de limpeza urbana, como coleta de lixo. No Brasil uma em cada 11 pessoas não dispõe desse serviço. Com isso, mais de 5 milhões de toneladas de resíduos sólidos deixam de ser coletadas anualmente e acabam descartadas no meio ambiente, com impactos negativos no solo, rios e na saúde da população. 

Recomendações

Análise das entidades mostrou que o maior impacto no aumento da geração de resíduos sólidos é decorrente do crescimento econômico, sendo 75% em função de aumento de poder aquisitivo, e 25% em função do crescimento populacional. 

“O relatório traz a recomendação no sentido de que precisa dissociar o crescimento econômico da maior geração de resíduos sólidos. Nós precisamos de um novo modelo de design, produção, venda, distribuição de materiais e de uma nova consciência no descarte e geração de resíduos.” 

Segundo o presidente do instituto, daqui até 2050, a perspectiva é de desenvolvimento econômico no mundo, revertendo essa rota de recessão e entrando numa rota de crescimento. 

Um exemplo prático para minimizar impactos é o sistema de responsabilidade estendida dos produtores, ou seja, quem fabrica um produto e o coloca no mercado passa a ser responsável pelo retorno deste produto. 

“Com isso, você traz um compromisso para que essa indústria faça produções mais amigáveis, mais fáceis de serem retornadas”, disse Silva Filho. Ele cita ainda o combate ao desperdício de alimentos e modos de ampliar o mercado de reciclagem, fazendo com que o resíduo se torne uma matéria-prima. 

O cenário considerado possível de ser implementado seria alcançar 60% de reciclagem no mundo, que atualmente é de 19%, e reduzir a geração per capita de resíduos sólidos para 600 gramas em média - atualmente a quantidade é 800 gramas por pessoa. O total de resíduos sólidos domiciliares gerados no mundo ficaria em torno de 2 bilhões de toneladas, em 2050, em um cenário considerado promissor e também factível. Além disso, tal cenário prevê que não haja mais destino inadequado no planeta já a partir de 2050.


Fonte: Agência Brasil. Por: Camilla Boehm / Edição: Maria Claudia.

Projetos Aprovados no Congresso Obrigam Municípios a Considerar as Mudanças Climáticas


Palácio do Congresso Nacional visto a partir do Palácio do Planalto. Foto: Cléber Medeiros/Senado Federal. 

Aprovados nas últimas duas semanas, projetos de lei que estabelecem diretrizes para planos de adaptação climática e resiliência urbana vão à sanção presidencial.

Dois projetos aprovados recentemente pelo Congresso, e que agora dependem apenas da sanção presidencial para virarem lei, colocam a adaptação às mudanças climáticas obrigatoriamente no radar de todas as prefeituras do Brasil. Enquanto o PL 4129/21 estabelece parâmetros mínimos para planos de adaptação às mudanças do clima em nível local, municipal, estadual, regional e nacional, o PL 380/23 – o PL das Cidades Resilientes – muda o Estatuto das Cidades para determinar que todos os municípios adotem medidas que aumentem a resiliência das cidades às mudanças climáticas. 

O primeiro deles foi aprovado no dia 12/06/2024. O PL 4129/21, proposto pelos deputados e deputadas Tabata Amaral (PSB-SP), Nilto Tatto (PT-SP), Joenia Wapichana (Rede-RR), Alessandro Molon (PSB-RJ), Camilo Capiberibe (PSB-AP) e Talíria Petrone (PSOL-RJ), estabelece que os planos de adaptação devam identificar “efeitos adversos atuais e esperados” das mudanças climáticas no território, bem como estabelecer medidas e prioridades para enfrentar desastres, com objetivo de diminuir a vulnerabilidade e a exposição dos “sistemas ambiental, social, econômico e de infraestrutura, em áreas rurais e urbanas”. 

Os investimentos realizados pelo poder público, de acordo com o texto aprovado, deverão ser feitos de forma coordenada, com base nos graus de vulnerabilidade identificados em estudos de análise de risco climático. As políticas públicas em todos os níveis deverão ser feitas em concordância com os compromissos assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris, visando a diminuição de emissões de gases de efeito estufa – o que inclui a obrigação de estimular a diminuição de emissões na agropecuária –, e com a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil

O texto prevê ainda a priorização, em cada plano, para as áreas de infraestrutura urbana e direito à cidade – a exemplo de ações nas áreas de habitação, áreas verdes, transportes, saneamento e segurança alimentar e hídrica –, infraestrutura nacional estratégica – como as de comunicações, energia, transportes, entre outras – e soluções baseadas na natureza, que integram, simultaneamente, “ações de adaptação e mitigação da mudança do clima”. Todas essas áreas deverão necessariamente considerar a adaptação às mudanças climáticas em seus projetos. 

A elaboração dos planos deverá ser feita com a participação da sociedade civil – incluindo as populações mais vulneráveis às mudanças do clima e o setor privado, “compatibilizando a proteção do meio ambiente com o desenvolvimento econômico”. Revisões deverão ser realizadas a cada 4 anos, junto com os Planos Plurianuais dos governos federal, estaduais e municipais. Cada esfera de governo deverá disponibilizar os seus planos de adaptação na íntegra, pela internet, e eles poderão ser financiados pelo Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (FNMC). 

Apesar dos pontos positivos, o texto aprovado pelo Senado – após o projeto já ter sido aprovado na Câmara, no fim do ano passado – ainda acabou enfraquecido ao ser novamente analisado pelos deputados. Isso porque dois dispositivos que previam a consideração de fatores de “etnia, raça, gênero, idade e deficiência” na análise de vulnerabilidades, incluídos pelo relator do projeto no Senado, Alessandro Vieira (MDB-SE), acabaram sendo retirados pelo relator dessas alterações na Câmara, o deputado Duarte Junior (PSB-MA). 

Como detalhou o Instituto Socioambiental, Duarte Junior chegou a apresentar um relatório inicial recomendando a aprovação total do texto do Senado, mas retirou os trechos mencionados após pressão de parlamentares da extrema-direita. Dessa forma, o foco no combate ao racismo ambiental – a forma como os efeitos das mudanças climáticas atingem de forma desigual populações racializadas – não será mais, necessariamente, uma obrigação dos governos. Já o PL 380/23 – também conhecido como PL das Cidades Resilientes –, proposto pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP) e aprovado nesta quinta-feira (20), modifica o Estatuto das Cidades para incluir, entre as diretrizes gerais das políticas urbanas, a “adoção de medidas integradas” de adaptação às mudanças climáticas e “a mitigação dos seus impactos, de forma a garantir a resiliência das cidades a essas mudanças, com prioridade para contextos de vulnerabilidade”. Essas ações deverão ser tomadas pelos municípios com base em “estudos de análise de riscos e vulnerabilidades climáticas”. 

Preparação dos municípios

Uma audiência pública realizada nesta quinta – mesmo dia da aprovação do PL das Cidades Resilientes –, na Comissão de Meio Ambiente da Câmara, tratou de ações que os municípios podem adotar para melhorar sua adaptação às mudanças climáticas. Na sessão, o presidente da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), Mário William, apresentou 17 orientações aprovadas pela instituição para “ações de segurança e resiliência em caso de desastres naturais”, informou a Agência Câmara

Entre as normas mencionadas por William estão as que tratam de “salas de crise” para monitoramento climático e gestão de desastres, a exemplo do Centro de Operações Rio, criado no Rio de Janeiro em 2010, após grandes inundações atingirem a cidade. “Em uma das previsões de tempestades, foi decretado ponto facultativo. E realmente houve invasão do mar nas ruas, houve inundações. Isso ajudou a prevenir graves situações”, disse o presidente da ABNT. “Então, essa é a função dessa norma: orientar com antecedência a população a tomar os devidos cuidados de proteção”, completou. 

O deputado Júlio Lopes (PP-RJ), que solicitou a audiência, afirmou que vai protocolar um projeto de lei que visa tornar a criação desses centros de operações obrigatória em todo o país. 

Mário William mencionou ainda outras normas, como as que tratam de “diretrizes para a gestão de incidentes, continuidade de negócios e retomada de atividades pós-desastres e certificação de ‘cidades sustentáveis’”, segundo a Agência Câmara. De acordo com o convidado, apenas as cidades de São José dos Campos e Jundiaí, ambas no estado de São Paulo, têm a certificação de “cidades sustentáveis” atualmente. 

A citada Jundiaí, por sinal, também mostra estar atenta às discussões sobre planos climáticos que ocorrem a nível federal. Com auxílio da plataforma Diários do Clima, que filtra normas ambientais publicadas nos diários oficiais municipais de 395 cidades brasileiras, a reportagem encontrou a publicação do PL 14366/24, proposto pelo prefeito Luis Fernando Machado (PL), já aprovado pela Câmara Municipal e que agora depende apenas da sanção do prefeito para virar lei. 

Entre as diversas modificações que o projeto traz ao Plano Diretor da cidade está a criação da Política Municipal de Mitigação das Mudanças Climáticas – que cita, entre outros objetivos, “ações de defesa contra as consequências das mudanças climáticas ou os eventos meteorológicos e climatológicos extremos”, “identificar ações de combate às causas das mudanças climáticas, ou da crescente elevação da temperatura média do planeta”, e a participação social nas ações de adaptação e a cooperação com municípios vizinhos. 

O projeto prevê a criação de um inventário de emissões de gases do efeito estufa resultantes de atividades humanas e um plano com detalhamento de ações “essenciais” para a redução, no município, de 50% dessas emissões até 2030. Também deverão ser detalhadas as vulnerabilidades climáticas da cidade, com identificação das ameaças de eventos extremos e, como parte de um plano de adaptação e mitigação, a elaboração de um cronograma para implementação de ações que fortaleçam a resiliência climática da cidade. 

O projeto também determina a ampliação e aprimoramento de uma série de ações ambientais por parte da prefeitura, como a arborização urbana, o aumento da permeabilidade do solo, desassoreamento de rios, monitoramento da qualidade do ar e um programa de hortas urbanas, entre outras. 

Essa está longe de ser uma realidade para todas as cidades brasileiras atualmente, inclusive nas capitais. Um levantamento divulgado no mês passado pelo Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN) revelou que, das 27 capitais brasileiras, 15 não têm qualquer plano de enfrentamento às mudanças climáticas. 

Segundo o instituto, ainda não tem esse plano as cidades de Aracaju (SE), Belém (PA), Boa Vista (RR), Campo Grande (MS), Cuiabá (MT), Goiânia (GO), Maceió (AL), Macapá (AP), Manaus (AM), Natal (RN), Palmas (TO), Porto Velho (RO), São Luís (MA) e Vitória (ES), além de Porto Alegre (RS), que sofre até hoje com as consequências dos grandes alagamentos registrados no mês passado – de acordo com o instituto, a capital gaúcha está com o documento “em processo de elaboração”, assim como Manaus (AM), Belém (PA) e Vitória (ES). 

Porém, após a sanção dos dois projetos de lei aprovados no Congresso, todos os municípios brasileiros deverão incluir a agenda de adaptação às mudanças do clima em suas políticas públicas. Eles terão, para auxiliar na elaboração desses planos, diretrizes mínimas estabelecidas em lei federal e oportunidades de financiamento para a implementação de seus planos de adaptação.


Fonte: O Eco. Por: Gabriel Tussini.

Da Moenda Para a Célula a Combustível: Caldo de Cana É Usado Para Produzir Energia Elétrica


O uso do caldo de cana direto evita a formação de vinhaça, resíduo ambientalmente perigoso decorrente da produção de etanol - Foto: Cecília Bastos/USP Imagens. 

Processo não requer a transformação do caldo in natura em etanol, feita nas usinas de álcool, impedindo a formação de resíduos que prejudicam o meio ambiente. 

Pesquisadores do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), órgão associado a USP, testaram o uso de caldo de cana para gerar energia elétrica em células a combustível. O processo dispensa a transformação do caldo in natura em etanol, feita nas usinas de álcool, impedindo a formação de resíduos nocivos ao meio ambiente. Após o êxito dos experimentos em laboratório, os cientistas vão desenvolver a aplicação da técnica em escala industrial. 

“A célula a combustível tem o mesmo princípio de funcionamento de uma pilha. A diferença é que o combustível serve como reagente para ser consumido e gerar eletricidade”, explica o pesquisador do Ipen, Almir Oliveira Neto, que coordenou a pesquisa. “Na célula, há dois eletrodos, o ânodo, onde o combustível é oxidado, e o cátodo, onde o oxigênio da oxidação é reduzido. Eles são conectados por uma membrana que atua como eletrólito, conduzindo eletricidade, formando um sistema que fornece energia elétrica.” 

“No dispositivo que foi desenvolvido na pesquisa, a oxidação do caldo de cana acontece no ânodo e a redução de oxigênio no catodo. O objetivo do experimento era obter energia da biomassa com o mínimo impacto ambiental possível. Para isso, utilizou-se o caldo de cana em uma célula a combustível para gerar energia elétrica”, diz o pesquisador. “O uso do caldo de cana direto evita a formação de vinhaça, um resíduo ambientalmente perigoso decorrente da produção de etanol, contribuindo, assim, para a preservação do meio ambiente.” 

Modelo da célula a combustível com caldo de cana montado em laboratório - Foto: Arquivo pessoal dos pesquisadores. 

Segundo Oliveira Neto, a célula a combustível pode usar o caldo obtido diretamente pela moagem da cana, como o vendido nas feiras livres. “No entanto, é preciso uma padronização, pois ele pode apresentar variações em decorrência da safra de cana”, observa. “No nosso trabalho, produzimos um caldo de cana sintético a fim de poder comparar os resultados, mas o caldo de cana in natura foi empregado numa pesquisa anterior.”

Sem resíduos ambientais 

Bruno Villardi, um dos pesquisadores envolvidos no projeto, explica como funciona uma célula a combustível e de que forma a pesquisa contribuirá com a geração de energia limpa. “Tanto a oxidação do álcool quanto a do caldo de cana ocorrem de forma parcial, ou seja, a reação não tem aproveitamento total em relação ao número de elétrons”, ressalta o cientista. “O uso direto do caldo de cana, porém, tem a vantagem de não gerar resíduos ambientais, e além da geração de energia pode ser direcionado a fabricação de produtos de maior valor agregado, como os ácidos glucônico, sacárico, lático, levulínico e furfural, que têm diversas aplicações nas indústrias alimentícia, de cosméticos, farmacêutica e de polímeros.” 

Oliveira Neto destaca que o protótipo da célula a combustível desenvolvido na pesquisa permite o aumento de escala em laboratório. “Para se observar o desempenho com maiores quantidades de caldo de cana e energia serão necessários o aumento da área dos eletrodos, e desenvolvimento e ampliação de escala”, planeja. “Além disso, será preciso um maior montante de recursos públicos e privados para a concretização do objetivo final, o uso do dispositivo em escala industrial.” 

O estudo teve a participação dos pesquisadores Bruno Villardi e Júlio Nadenha, doutores formados pelo Programa de Tecnologia Nuclear e Materiais da USP e do Ipen; Victória Maia, doutoranda do programa; e dos pós-doutorandos Priscila Zambiazi e Rodrigo Souza, do Centro de Células a Combustível e Hidrogênio do Ipen. A pesquisa teve a supervisão de Almir Oliveira Neto, orientador credenciado no Programa de Tecnologia Nuclear e Materiais da USP e do Ipen, onde Souza atua como co-orientador. 



Fonte: Jornal da USP. Por: Júlio Bernardes.