Parque Nacional do Caparaó (MG). |
Parques brasileiros poderiam gerar uma economia de R$ 168 bilhões, se fossem tão eficientes quanto os parques americanos. ICMBio promete contratar 800 servidores e finalizar planos de manejo para suprir necessidades dos parques da Amazônia, avaliados pelo Tribunal de Contas da União.
O Brasil é o país mais rico do mundo em termos de biodiversidade e belezas naturais. Nenhuma outra nação oferece aos seus moradores e visitantes um cardápio mais variado de espécies e paisagens para contemplar. Montanhas, chapadas, planícies, desertos, dunas, cavernas, cânions, florestas, praias, cachoeiras, recifes de coral, ilhas, savanas, pampas, etc. Não falta o que fotografar nesse país.
Muitas dessas paisagens estão dentro de unidades de conservação (UCs), o que lhes garante um mínimo de proteção. Muito pouco dessa riqueza natural, porém, é transformado em riqueza econômica e social para o país. O aproveitamento do potencial turístico da maioria dessas unidades de conservação é pífio, como confirma um relatório produzido recentemente pelo Instituto Semeia. Um caso gritante de desperdício de oportunidade, que se perpetua há muitos governos nesse país.
Para se ter uma ideia, segundo o relatório do Semeia, a média de visitação nos parques nacionais brasileiros é de apenas 1,1 visitante por hectare/ano (considerando os 31 parques para os quais há estatísticas de visitação, num total de 5,2 milhões de hectares). Se forem excluídos dessa conta os parques de Foz do Iguaçu e da Tijuca, esse índice despenca para 0,3 visitantes/hectare/ano – o que significa dizer que, além de a taxa de visitação ser baixa como um todo, o pouco turismo que existe neles está altamente concentrado em apenas dois parques, um abençoado com cataratas e o outro, com o Cristo Redentor.
Parque Nacional do Grand Teton (EUA). |
Nos Estados Unidos, comparativamente, a taxa média de visitação nas principais unidades de conservação federais (parques, reservas e áreas de recreação) é de 3,5 visitantes/hectare/ano – mais do que o triplo da média brasileira, numa área seis vezes maior, de 32 milhões de hectares.
Se forem excluídos os parques nacionais do Alasca, que são os de maior extensão e mais remotos do país – correspondendo a 60% de toda a área gerenciada pelo Serviço Nacional de Parques (NPS) dos Estados Unidos – o índice sobe para quase 11 visitantes/hectare/ano.
Segundo os dados mais recentes do NPS (que, ao contrário do Brasil, produz estatísticas anuais detalhadas sobre todas as suas unidades), o sistema nacional de parques dos Estados Unidos recebeu 273 milhões de visitantes em 2013, que juntos injetaram uma bolada de US$ 14,6 bilhões (com B de bola) nas comunidades de entorno dos parques.
Só o Parque Nacional de Yellowstone (o mais antigo do mundo, criado em 1872), recebe mais de 3 milhões de visitantes por ano. O Parque Nacional do Grand Teton, logo abaixo dele, recebe outros 2,5 milhões. O que significa dizer que esses dois parques, sozinhos, já recebem mais turistas do que os 31 parques nacionais brasileiros incluídos no levantamento do Semeia.
Os Estados Unidos têm muito menos biodiversidade e áreas selvagens do que o Brasil. Mas cuidam e aproveitam aquilo que têm muito melhor do que nós.
Potencial econômico
E para aqueles que não se convencem só com o benefício ambiental, aqui vai um argumento de incentivo econômico: pelos cálculos do Semeia, “supondo que melhorias na infraestrutura e gestão das UCs sejam capazes de aumentar a visitação dos parques brasileiros para um terço do padrão atual dos EUA, estima-se que as atividades econômicas dinamizadas sejam capazes de gerar receita de R$ 168 bilhões em 10 anos (ordem de grandeza do PIB atual de Santa Catarina)”.
R$ 168 bilhões não significaria muita coisa dentro da economia brasileira – assim como US$ 14 bilhões é quase nada dentro da economia americana –, mas seria uma fortuna tremenda para as economias locais dos municípios e Estados que abrigam essas unidades de conservação. Com planejamento e investimentos adequados, em escala regional, o turismo de natureza pode ser uma atividade econômica muito mais valiosa do que a agricultura ou a indústria. Quem sabe assim as unidades de conservação deixariam de ser vistas como um empecilho e passariam a er vistas como uma ferramenta de desenvolvimento econômico. É assim que funciona nos Estados Unidos e outros países que tratam suas áreas protegidas com o devido respeito.
No Brasil, é fácil entender por que a visitação nas unidades de conservação é baixa. Se nem os funcionários dos parques têm infra-estrutura adequada para trabalhar, imagine os turistas para visitar. A falta de recursos financeiros e humanos é um problema crônico e disseminado das unidades de conservação brasileiras, muitas das quais vivem em situação de abandono quase que total – não só as federais, mas também as estaduais e municipais. Muitas são criadas, mas poucas são implementadas de verdade. Existem apenas no papel.
Na Amazônia, segundo um levantamento publicado em novembro de 2013 pelo Tribunal de Contas da União (TCU), apenas 4% das unidades de conservação estão devidamente implementadas. A maioria não tem plano de manejo, quadro de funcionários ou infra-estrutura minimamente adequadas para funcionar. Das 313 UCs federais avaliadas no estudo, por exemplo, apenas 134 tinham plano de manejo aprovado.
Soluções a caminho?
Após a publicação do relatório, o TCU deu ao Ministério do Meio Ambiente (MMA) um prazo de 180 dias para apresentar um plano de soluções para o problema. O ministério respondeu dizendo, entre outras coisas, que realizaria um concurso para a contratação de 500 novos servidores. Mas o prazo venceu (em julho deste ano), e o concurso até agora não foi realizado, como noticiou o site Mídia e Desmatamento na Amazônia.
Procurado pela reportagem do Estadão no final de julho, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio – órgão do MMA responsável por gerir as unidades de conservação do país) informou que realizou concurso para contratação de 271 servidores em abril, e que os aprovados seriam convocados para começar a trabalhar ainda neste ano; e que o Ministério do Planejamento “já autorizou o instituto a realizar concurso público para preencher cerca de 800 vagas, de nível superior e médio, em 2015”.
Com relação a planos de manejo, o ICMBio afirma: “Do total de 72 UCs localizadas da Amazônia, 17 concluirão a elaboração e ou revisão dos planos de manejo, ainda em 2014. Outras 24 devem finalizar este trabalho até o final de 2015. E as demais 31 UCs vão iniciar a elaboração dos planos de manejo em 2016, com previsão de término em 2017”.
A íntegra das respostas enviadas à reportagem pode ser lida aqui: ICMBio-TCU.
O TCU, por sua vez, informou que “recebeu documentações e resultados solicitados nesse acórdão” e que, a partir de agora, “irá analisar as informações” submetidas pelo MMA.
Por: Herton Escobar (Estadão).
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