Liberdade e Bucolismo

A pressão, o cotidiano agitado, as obrigações maçantes, o trânsito caótico, o barulho do batente e a poluição de uma grande metrópole, não raro, comprometem a qualidade de vida de todo e qualquer cidadão - podendo ocasionar estresse, fadiga e até depressão. Mas quando a gravata e o sapato insistem em apertar o pescoço e o calcanhar ele deseja se libertar das exigências de um mundo burocrático e cair na estrada, fugir da cidade e respirar um ar mais bucólico. Porém, existem pessoas de tremenda ousadia que abdicam de uma vida confortável a fim de se aventurar e viver novas experiências, renunciando endereço fixo e herança familiar. Destinado a seguir para o norte e apenas com uma mochila nas costas, "sumir do mapa" foi o caso real de Christopher McCandless! 

Baseado em fatos, o filme Na Natureza Selvagem (Into The Wild, 2007) - com roteiro e direção de Sean Penn - conta a história comovente de um jovem libertário que abandona, em 1990, a proteção da sua família abastada e parte numa viagem solitária e fascinante, cujo desafio ao fim dessa jornada se apresentará extremo e gélido. O aventurado - dirigindo um road movie registrado pelos próprios olhos a explorar um novo mundo - se depara com lindas paisagens no meio do caminho que só pode compartilhar com seu coração absorto. 

Entre florestas, cânions, desfiladeiros, corredeiras, planícies, praias e campos de colheitas Alexander Supertramp - pseudônimo adotado por ele para não deixar pistas do seu paradeiro - interage de forma tão desprendida com o ambiente natural que as circunstâncias das suas andanças o levam ao encontro de gente tão simples e generosa quanto ele. Embora cative amizades tão facilmente, seu compromisso está em não permanecer no mesmo lugar por muito tempo e só descansar quando sua meta for atingida, mesmo que isso exija assumir um alto risco (talvez mal calculado ou pura inconsequência). 

Um longa-metragem tão belo e impressionante se torna ainda mais emocionante com a trilha sonora composta e interpretada por Eddie Vedder. A fita de 2 horas e 27 minutos abre com um trecho da versão instrumental de Guaranteed e segue com Long Nights [no frio do Alasca], Hard Sun [na pista com seu velho Datsun], Rise [de mochilão na 'carcunda' pedindo carona], Society, etc.  

Auto-retrato de C. McCandless (1992).

As reflexões do próprio Chris (vivido por Emile Hirsch) e a narração adicional de sua irmã Carine (vivida por Jena Malone) envolvem o espectador num drama que evoca desalento e frustração em um seio familiar em paradoxo com a liberdade máxima e felicidade de um andarilho. Ela diz que seu irmão "avaliava a si mesmo e as pessoas ao redor com um código moral tremendamente rigoroso" e que "a falsa segurança e excesso material o afastavam de sua verdadeira existência". 

Fã de escritores como Leo Tolstoi, Jack London e Henry David Thoreau, tornou-se uma espécie de ermitão - seja por amor a natureza ou desconfiança da humanidade - e numa passagem do filme cita: "Em vez de amor, dinheiro, fé, fama, equidade... me dê a verdade" (Thoreau). Mas em um momento derradeiro Chris admite: "A felicidade só é verdadeira quando compartilhada. (...). Tive uma vida feliz, e agradeço ao Senhor. Adeus e que Deus abençoe a todos". O viajante esteta preferiu viver a fantasia perfeita dentro de uma realidade feroz a ser envenenado pela civilização.

Por: Gustavo Nobio. Sustentabilista, comunicador ambiental, articulista e administrador de conteúdo da mídia online #SenhorEco. Técnico em Meio Ambiente pela FUNCEFET (RJ).