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A Vida é Uma Série de Colisões Com o Futuro

A filosofia de José Ortega y Gasset (1883-1955) é sobre a vida. Ele não está interessado em analisar o mundo de modo frio e desprendido. Em vez disso, quer explorar como a filosofia pode se engajar criativamente com a vida. A razão, acredita Ortega, não é algo passivo, mas ativo - algo que nos permite entender como lidar com as circunstâncias nas quais nos encontramos e mudar nossas vidas para melhor. 

Em Meditações do Quixote, publicado em 1914, Ortega escreveu: "Sou eu mesmo e minha circunstância". René Descartes (1596-1650) dissera que era impossível imaginar nós mesmos como seres pensantes e ainda duvidar da existência do mundo exterior, incluindo nossos próprios corpos. Mas Ortega afirmou que não faz sentido ver a nós mesmos separados do mundo. Se quisermos pensar seriamente sobre nós mesmos, temos de considerar que estamos sempre imersos em circunstâncias particulares, muitas vezes opressivas e limitadoras. Tais limitações não são apenas do ambiente físico, mas também de nossos pensamentos, que contêm preconceitos, e de nosso comportamento, moldado pelo hábito.

Enquanto muitas pessoas vivem sem refletir sobre a natureza de suas circunstâncias, Ortega disse que os filósofos não só devem se empenhar para entender suas circunstâncias como buscar ativamente mudá-las. De fato, ele afirmou que o dever do filósofo é expor as pressuposições subjacentes a todas as nossas crenças.

A energia da vida

A fim de efetuar essa mudança, Ortega defendeu que os filósofos devem primeiro reconsiderar suas crenças, entender de onde elas vêm e, então, comprometer-se em criar novas possibilidades. A opinião de Ortega tem muito em comum com Edmund Husserl (1859-1938), o pai da fenomenologia, que via a realidade como um processo em evolução no qual o indivíduo e o mundo são dependentes um do outro. Da mesma forma, Ortega afirmou que nascemos num mundo que nos molda, mas que podemos mudar o nosso mundo modificando o modo como o percebemos. 

Ortega reconheceu que, não importa o quanto nos liberemos para imaginar novos futuros, a circunstância sempre limitará a extensão da realização desses futuros. A realidade do mundo sempre colidirá com nossos sonhos, mas mesmo assim devemos sonhar em libertar a nós mesmos desde o presente. É por isso que Ortega vê a vida como uma série de colisões com o futuro.

A ideia de Ortega é desafiar as circunstâncias tanto no nível pessoal quanto no político. Ela supõe que toda tentativa de mudança será desafiada, mas que temos o dever de continuar avançando contra as circunstâncias limitadoras. Em A Rebelião das Massas, ele advertiu que a democracia carrega em si a ameaça da tirania pela maioria, e que viver pelo império da maioria - ou "como todo mundo" - é viver sem visão pessoal ou código moral. A menos que nos engajemos criativamente com nossas próprias vidas, dificilmente estaremos vivendo. É por isso que, para Ortega, a razão é vital: ela mantém a energia da vida.

Sobre José Ortega y Gasset

Nasceu em Madri, Espanha. Estudou filosofia na cidade e, depois, em várias universidades alemãs - sendo influenciado pela filosofia de Immanuel Kant (1724-1804) -, antes de se estabelecer na Espanha como professor universitário.

Ao longo da vida , ganhou o sustento não apenas como filósofo, mas também como jornalista e ensaísta. Também esteve engajado ativamente na política espanhola nas décadas de 1920 e 1930, mas seu envolvimento chegou ao fim com o início da Guerra Civil Espanhola, em 1936. Exilou-se na Argentina, onde permaneceu até 1945, desiludido com a política. Após três anos em Portugal, retornou a Madri em 1948, onde fundou o Instituto de Humanidades. Continuou trabalhando como filósofo e jornalista pelo resto da vida.

Fonte: The Philosophy Book (DK UK). Tradução: Douglas Kim.

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