Translate / Traduzir

Era Industrial Acabou com 1.800 Anos de Resfriamento dos Oceanos

A entrada na era industrial marcou uma profunda transformação para os oceanos: durante quase dois milênios suas temperaturas vinham baixando de maneira contínua, mas o aquecimento devido às atividades humanas reverteu a tendência. Foi o que revelou um estudo internacional publicado pela revista Nature Geoscience, que teve a colaboração de diversas equipes francesas. 

Em todos os mares do globo, desde os trópicos até perto dos polos, os pesquisadores reconstruíram as variações de temperaturas das águas superficiais ao longo dos últimos dois mil anos, a partir de dados extraídos do zooplâncton fóssil enterrado nos sedimentos marinhos ou ainda de certas moléculas orgânicas. O teor de magnésio e de cálcio no caso dos primeiros e o tipo de lipídios que elas continham, no caso das segundas, fornecem informações sobre o calor das águas superficiais onde esses organismos evoluíam. 

Revelou-se então que "as temperaturas de superfície médias do oceano diminuíram regularmente entre o século 1 e o início do século 19". O estudo não registra essa queda em graus Celsius, uma vez que as médias recobrem fortes disparidades regionais. "Globalmente, o resfriamento passado é mais pronunciado perto dos polos, com valores que podem chegar a 2,5-3 graus Celsius, do que nas zonas tropicais, onde ele se situa em torno de 1 grau Celsius nos dois últimos milênios", afirma Guillaume Leduc, pesquisador do CNRS no Centro Europeu de Pesquisas e Ensino de Geociências do Meio Ambiente, cossignatário do estudo. 

"Até hoje só dispúnhamos de levantamentos de temperatura, medidos por navios oceanográficos, para o século passado", diz Marie-Alexandrine Sicre, diretora de pesquisas do CNRS no Laboratório de Oceanografia e do Clima, que também participou desse trabalho. "Pela primeira vez, temos uma visão retrospectiva da evolução climática do oceano por dois milênios. O resfriamento que evidenciamos até o início da era industrial é uma descoberta." 

Como explicar esses quase dois milênios de resfriamento dos mares? Os pesquisadores rodaram modelos – que permitem chegar até somente os anos 800 – introduzindo neles diferentes fatores que poderiam ter influenciado: variações da órbita da Terra, intensidade da radiação solar, gases de efeito estufa, desmatamento e vulcanismo. Conclusão: no período entre os anos 800 e 1800, a atividade vulcânica é o único parâmetro que poderia explicar esse resfriamento. 

Atividades humanas 

Já se sabiam que as grandes erupções vulcânicas – tais como as de Pinatubo (Filipinas, 1991), do Krakatoa (Indonésia, 1883) e de Tambora (Indonésia, 1815) – poderiam abaixar temporariamente as temperaturas na superfície da Terra, às vezes durante vários anos. As cinzas e os gases que elas lançam para a estratosfera se transformam em aerossóis que bloqueiam os raios solares. O estudo mostra que essas erupções também têm por consequência "um resfriamento a longo prazo da superfície dos oceanos", explica Helen McGregor (Universidade de Wollongong na Austrália), primeira signatária do artigo. 

Então tudo mudou com o início da industrialização. Em razão do aquecimento associado às atividades humanas, os oceanos têm esquentado progressivamente. "É espantoso constatar que a mudança climática de origem antrópica já esteja registrada nos sedimentos marinhos que se depositaram ao longo dos dois últimos séculos", observa Guillaume Leduc

Essa mudança é ainda mais notável porque uma grande parte da energia acumulada no sistema climático, sob efeito do aquecimento global, é absorvida pelos oceanos, e, portanto, estes têm um papel crucial na regulação do clima de nosso planeta. Como as erupções vulcânicas não pararam com a era industrial, Marie-Alexandrine Sicre acredita que o efeito "resfriante" delas sobre os oceanos esteja minimizando o aquecimento real dos mares diretamente induzido pelo homem.

Por: Pierre Le Hir (Le Monde).

0 comentários:

Postar um comentário