Criada no final de 2017 pela Lei Federal nº 13.576 e regulamentada parcialmente pelo Decreto Federal 9.308/2018, a Política Nacional de Biocombustíveis (“RenovaBio”) é a primeira política brasileira clara que implementa o Acordo de Paris em um segmento de mercado visando sua transição à economia de baixo carbono. Daí sua representatividade.
De forma sucinta, a RenovaBio permite aos distribuidores de combustíveis neutralizar emissões de gases de efeito estufa (“GEE”) provindos da queima de combustíveis fósseis, por meio da compra de Créditos de Descarbonização (“CBios”). Os CBios serão emitidos por produtores/importadores de biocombustíveis (“emissores primários”), via instituições financeiras (“escrituradores”), com base no lastro da eficiência energético-ambiental da produção, a ser auferida por firmas inspetoras.
A relevância está no mecanismo de mercado e multiplicidade de players da RenovaBio: todos os agentes do setor poderão participar. Ao final, as metas setoriais são refletidas nas metas internacionais assumidas pelo Brasil no âmbito da Convenção Quadro das Nações Unidas Sobre Mudança do Clima. A tese funciona. Vamos à prática.
Três grandes desafios à operacionalização:
1) Autoridade reguladora do mercado
A quem competirá, a regulação e fiscalização do mercado? O Comitê RenovaBio, instituído pelo Decreto Federal 9.308/2018 e já operante (1ª reunião em 02.4.2018), detém atribuições de monitoramento da oferta e demanda de biocombustíveis e, até o momento, representa o órgão mais técnico a influenciar o mercado, ainda que indiretamente, via proposição das metas setoriais a serem desdobradas aos distribuidores e definidas pelo Conselho Nacional de Política Energética (“CNPE”) até 24.6.2018.
De outro lado, a Política Nacional Sobre Mudanças do Clima (“PNMC” – Lei Federal nº 12.187/2009) prevê que o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (“MBRE”) será operado em bolsa de valores e de mercadoria e futuros, por instituições autorizadas pela Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”). Embora a CVM detenha parecer anterior à PNMC descaracterizando espécies de créditos de carbono como valores mobiliários (e, portanto, excluindo-os do âmbito de sua regulação), os “fatos novos” representados pela PNMC e RenovaBio podem motivar a revisão desse posicionamento.
2) Proteção contra especulação
Nenhum mercado está livre de especuladores, sendo necessários esforços para combater sua manipulação artificial. No caso da RenovaBio, o risco está na compra em massa de CBios por um grande player/especulador no mercado primário, de modo a retirar, momentaneamente, a liquidez no mercado e, assim, forçar uma “alta” dos preços, considerando a obrigação dos distribuidores em comprá-los, sob pena de vultosas multas administrativas de até 5% do faturamento bruto no exercício anterior.
Para mitigar esse risco, debate-se a possibilidade de conferir aos distribuidores direito de preferência (ou mesmo exclusividade) no mercado primário.
3) Precificação dos CBios
O cálculo do lastro dos CBios ainda depende de regulamentação. A nosso ver, a Nota de Eficiência Energético-Ambiental deverá considerar as diferenças entre biomas e commodities oleaginosas para induzir maior liquidez no mercado.
Por: Ana Luci Grizzi e Leonardo Vitor Freire (Jota.Info).
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