A captação da água da chuva é uma prática comum efetuada para diversas finalidades, entre elas, o consumo humano em regiões com baixa poluição atmosférica. Nos centros urbanos seu uso não potável tem sido incentivado por gestores públicos, em busca de uma gestão das águas mais racional e descentralizada. Apesar disso, a regulamentação do uso da água de chuva ainda é insuficiente. Em âmbito federal não há uma legislação que apresente diretrizes para a utilização desse bem, entretanto, alguns estados e municípios possuem legislações específicas, como os municípios de Recife, São Paulo, Curitiba, Rio de Janeiro e os estados do Paraná, Goiás, Maranhão, Paraíba, entre outros.
A presente pesquisa objetivou analisar as regulamentações brasileiras que dispõem sobre a captação de água da chuva sinalizando seus avanços, limitações e possíveis lacunas. O estudo considerou 60 legislações, caracterizando-as quanto ao tipo de instrumento, ano, âmbito legal e finalidades, seguida da análise qualitativa dessas leis. Os resultados demonstraram que a normatização para o aproveitamento da água da chuva no Brasil é relativamente recente, tendo sido instituída a primeira lei em 2002.
A maioria dessas leis é municipal e trata da normatização do uso da água da chuva para fins não potáveis, apesar de estar em curso no país o Programa Um Milhão de Cisternas especificamente voltado ao abastecimento humano por meio de água da chuva no Semiárido. Algumas leis obrigam a captação da água da chuva, sem especificar critérios técnicos para construção dos sistemas e sem enfatizar a relevância do uso desse recurso. Do contrário, as que instituem o Programa de Conservação e Uso Racional da Água ressaltam a importância do uso racional das águas e buscam conscientizar os usuários sobre o combate ao desperdício e a utilização de fontes alternativas, evidenciando um esforço de valorização do uso da água da chuva.
Constatou-se a fragilidade dos dispositivos legais, sendo necessária a atuação do Poder Público no sentido de instituir uma legislação mais consistente que considere os diversos usos da água de chuva (potável e não potável), defina os requisitos mínimos de projeto dos sistemas de aproveitamento, inclusive para assegurar a segurança sanitária, e estabeleça competências quanto ao monitoramento e controle da qualidade da água e a manutenção desses sistemas quando utilizados para abastecimento humano.
Ter acesso à água potável é fundamental para o ser humano e exerce implicações substanciais sobre sua saúde ao prevenir uma série de doenças relacionadas com a água e ao propiciar a promoção da qualidade de vida. Apesar do caráter essencial atribuído à água e de sua relevância ser indiscutível, o somatório de múltiplos fatores como a falta de investimentos públicos, as desigualdades e exclusão social, o uso e a ocupação do solo, a degradação e a exploração excessiva dos corpos hídricos têm resultado em problemas de acesso à água, o que tem levado no caso brasileiro a um déficit elevado e incompatível com os avanços civilizatórios quanto ao direito à água.
Adoção de políticas públicas que venham enfrentar o déficit do abastecimento de água no Brasil passa pela necessidade da gestão das águas de forma racional, garantindo-se a democratização do acesso para os diversos usos. Tal gestão deve considerar as diferentes fontes disponíveis, não só as superficiais e subterrâneas, como também o potencial de aproveitamento das águas de chuva para diversos fins, inclusive o consumo humano, após os devidos cuidados.
Em áreas rurais e em locais onde não há poluição atmosférica significativa, de uma maneira geral, a água da chuva possui boa qualidade constituindo uma fonte alternativa para o abastecimento humano e uso para a produção, especialmente da agricultura familiar. Contudo, como os demais mananciais, o uso para consumo humano demanda a adoção de algumas medidas de proteção para garantir a segurança sanitária da água que será consumida, como por exemplo, o desvio dos primeiros milímetros de chuva e a desinfecção antes do consumo.
Essa prática é comum e tem sido crucial em diversos países como China, Austrália, Etiópia, Quênia e Uganda que utilizam as águas pluviais para o abastecimento humano. No Brasil, ao longo de anos, a população sertaneja vem utilizando a água da chuva para suprir suas necessidades básicas, destinando-a para os usos que requerem água de melhor qualidade como beber e cozinhar.
Com a implantação do Programa Um Milhão de Cisternas houve uma disseminação maior do uso das cisternas de placas que ampliou a capacidade de aproveitamento e armazenamento de água da chuva e permitiu que as famílias rurais pudessem captar água para seu consumo. Para essas famílias a utilização de água de chuva se reveste de caráter essencial e, sobretudo, como bem precioso e de boa qualidade.
Apesar disso é importante salientar que durante o seu percurso até o consumo a água da chuva pode ser contaminada e requer o seu manejo adequado do ponto de vista sanitário. Portanto, estabelecer diretrizes para sua utilização por meio de legislações específicas e adequadas à realidade local se faz necessário e contribui para regulamentar o seu uso.
A metodologia envolveu uma revisão da literatura relacionada ao tema e das legislações existentes seguida da análise crítica dos conteúdos.
Por: Anne Rosse e Silva e Patrícia Campos Borja (Portal Tratamento de Água). Leia na íntegra o artigo Aproveitamento de água de chuva no Brasil: avanços e limitações dos aspectos legais em formato PDF.
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