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Menos é Mais: Como o Decrescimento Salvará o Mundo


A exploração da natureza e a domesticação do mundo natural já passou dos limites. A humanidade está promovendo um ecocídio em larga escala que pode se transformar em suicídio.

“Acreditar que o crescimento (demo)econômico exponencial pode continuar infinitamente num mundo finito é coisa de louco ou de economista”, Kenneth Boulding (1910-1993). 

A humanidade já superou a capacidade de carga do Planeta e já ultrapassou 4 das 9 fronteiras planetárias. A lógica do crescimento econômico é incompatível com a sustentabilidade. Hoje em dia a preocupação maior do mundo é com a emergência sanitária provocada pela pandemia da covid-19. Mas, no longo prazo, a emergência sanitária é o maior desafio do século e é uma “ameaça existencial” à civilização como afirmou o presidente dos EUA, Joe Biden, na abertura da Cúpula dos Líderes do Clima. 

Mas o vício do egoísmo, da ganância e da cobiça funciona como uma ideologia que defende o lema do “Mais é melhor” e exalta o acumulo de bens e serviços e o enriquecimento ilimitado da humanidade às custas do empobrecimento e definhamento do mundo natural. Porém, existe uma lógica oposta que foi exposta por Jason Hickel, no livro “Less is more: Degrowth Will Save the World”. O livro fornece o argumento mais persuasivo e abrangente em favor do “decrescimento”, defendendo uma redução planejada do uso de energia e recursos para trazer a economia de volta ao equilíbrio com o mundo vivo de uma forma segura, justa e equitativa. 

O livro de Jason Hickel é uma contribuição essencial para o debate sobre a ultrapassagem da capacidade de resiliência da Terra e é uma leitura obrigatória para todas as pessoas preocupadas com a sobrevivência dos ecossistemas e, em especial, para os formuladores de políticas e analistas. Mas se os políticos e os empresários são, normalmente, obcecados com o crescimento econômico, todas as pessoas que defendem o meio ambiente precisam repercutir este livro que faz uma defesa do DECRESCIMENTO. 

Uma das afirmações centrais de Hickel, e que ele detalha na primeira parte do livro, é que “não há nada natural ou inato no comportamento produtivista que associamos ao homo economicus. Essa criatura é o produto de cinco séculos de reprogramação cultural. ” Em outras palavras, fomos encorajados, até mesmo compelidos a nos comportar de maneira a justificar o produtivismo e o acumulo de bens materiais. O autor considera que as propostas de desmaterialização da economia e o desacoplamento entre produção e recursos naturais não ocorre na prática, pois o que funciona é o “Paradoxo de Jevons”, já que os ganhos microeconômicos não ocorrem em nível macroeconômico. 

Além de defender o decrescimento, Hickel defende a justiça social e critica as desigualdades que são os subprodutos mais significativos e intencionais da expansão capitalista e um dos desafios mais intransponíveis que a população mundial tem que enfrentar. Ele diz: “a justiça é o antídoto para o imperativo do crescimento – e a chave para resolver a crise climática”. A conclusão de Hickel sobre a transição ideológica necessária deixa claro que não será difícil e que a janela de oportunidade se fecha rapidamente. Ele escreve como “a luta diante de nós é mais do que apenas uma luta pela economia. É uma luta por nossa própria teoria do ser. Requer descolonizar não apenas terras, florestas e povos, mas descolonizar nossas mentes”. 

O livro “Menos é mais” está alinhado com outros estudos fundamentais. Artigo de Steffen et. al (2015), que atualizou a metodologia e os dados das fronteiras planetárias, mostrou que quatro das nove fronteiras já foram ultrapassadas: Mudanças climáticas; Perda da biodiversidade; Mudança no uso da terra e Fluxos biogeoquímicos (fósforo e nitrogênio). Duas delas, a Mudança climática e a Perda de biodiversidade, são o que os autores chamam de “limites fundamentais” e tem o potencial para conduzir o Sistema Terra a um novo estado que pode levar a civilização ao colapso. As duas grandes ameaças que pairam sobre a civilização e a vida na Terra são: Mudanças climáticas e aquecimento global e o Ecocídio gerado pela 6ª extinção em massa.

Outra contribuição recente foi o relatório elaborado por Sir Partha Dasgupta, um dos mais prestigiados economistas contemporâneos. Dasgupta diz que os interesses da humanidade, a ideologia da engenhosidade humana e a apologia à tecnologia pregam que se pode fazer o uso do que se quiser da natureza. Mas este ideal de progresso, além de ser eticamente inaceitável, é economicamente desastroso. O gráfico abaixo resume a situação, pois enquanto a produtividade econômica aumenta, cresce o capital humano, mas diminui o capital natural. Para prosseguir um futuro sustentável exigirá uma mudança transformadora em nosso modo de pensar e agir.



Ou seja, enquanto a economia cresce, a humanidade enriquece e a natureza empobrece. A exploração da natureza e a domesticação do mundo natural já passou dos limites. A humanidade está promovendo um ecocídio em larga escala que pode se transformar em suicídio. A economia tradicional tende a ver a natureza apenas como um bem econômico a serviço do bem-estar da humanidade e como uma mercadoria que faz circular a economia pagando salários, lucros e juros. A tão decantada racionalidade do Homo economicus virou um problema de insensibilidade natural e uma prática especista, com sérios danos à biodiversidade. 

A mensagem central do livro “Menos é mais” é que o mundo precisa promover um decrescimento das atividades mais poluidoras do Planeta e promover a redistribuição dos bens públicos e comuns, como forma de evitar o colapso ambiental, garantindo não somente a qualidade de vida humana (com menos consumo), mas também a qualidade da vida ambiental e a regeneração ecológica. 

Por: José Eustáquio Diniz Alves; doutor em Demografia. Fonte: EcoDebate


Referências: 

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