A mente brilhante, que ganhou o prêmio Nobel de Economia em 1994 por revolucionar o campo da Matemática conhecido como Teoria dos Jogos, continua contribuindo para novas revoluções na ciência e na vida em sociedade. O matemático norte-americano John Nash, 86 anos, esteve em São Paulo no fim de julho de 2014 e falou sobre suas pesquisas atuais na Princeton University.
Nash veio ao Brasil para ministrar palestra no International Workshop on Game Theory and Economic Applications of the Game Theory Society (IWGTS), realizado na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP) no âmbito da Escola São Paulo de Ciência Avançada (ESPCA), modalidade de apoio da FAPESP.
Também participaram do evento, entre 25 e 31 de julho, outros três laureados com o Nobel em Ciências Econômicas: o matemático Robert Aumann (2005), da Hebrew University of Jerusalem, em Israel, e os economistas Eric Maskin (2007), da Harvard University, e Alvin Roth (2012), da Stanford University.
Muito antes de se tornar conhecido do público geral por ter sua história contada no filme Uma Mente Brilhante, de 2001, John Forbes Nash Jr. ganhou notoriedade no mundo acadêmico por suas contribuições à Teoria dos Jogos, área sistematizada em 1944 pelo matemático John von Neumann (1903-1957) e pelo economista Oskar Morgenstern (1902-1977).
Originalmente, os trabalhos na área utilizavam jogos em que os participantes precisavam fazer escolhas com base nas decisões dos seus oponentes, e os pesquisadores estudavam funções matemáticas que explicariam a competição ou a cooperação entre os jogadores. A pesquisa de Nash determinou o ponto de equilíbrio dessa relação, que passou a ser conhecido como Equilíbrio de Nash.
"Antes, entendia-se que, a partir de uma importância estabelecida, o que quer que uma pessoa ganhasse, a outra perdia. Por conta disso, jogar era visto apenas como uma formalidade. Com o tempo, o fato de haver ganho ou perda e a importância daquilo que estava em jogo se tornaram interesse de estudos", disse em entrevista à Agência FAPESP.
Uma das mais famosas aplicações do Equilíbrio de Nash é a usada no jogo conhecido como Dilema do Prisioneiro, em que dois homens são presos suspeitos de terem praticado o mesmo crime. Não há provas contra eles, que são interrogados separadamente e encorajados pela polícia a delatar um ao outro, ganhando em troca a liberdade.
Haveria, então, duas opções: calar-se ou acusar o companheiro. Se os dois se acusam mutuamente, são igualmente condenados; se calam, são soltos. Mas a desconfiança de um acusado sobre a decisão que o outro poderia tomar aumenta a probabilidade de os dois se acusarem, o que levaria ao pior resultado: a prisão de ambos.
A melhor solução para os dois jogadores é a menos provável, pois requer cooperação cega, dado que eles não conversam a respeito. Dessa forma, o mais provável é que eles se acusem, pois ambos têm mais a ganhar delatando o outro.
O Equilíbrio de Nash é a solução em que nenhum jogador pode melhorar seu resultado com uma ação unilateral. Nesse caso, se um acusado que tende a delatar o outro muda unilateralmente sua estratégia e decide colaborar com a polícia, ele "perde" no jogo e é preso.
O conceito proposto pelo matemático é considerado fundamental na Teoria dos Jogos e é um dos métodos mais usados nas Ciências Sociais para estimar o resultado de uma interação estratégica.
A partir desse entendimento, seu trabalho contribuiu para a aplicação de conceitos puramente matemáticos a diversas áreas do conhecimento que tenham situações análogas a jogos, entre as quais a Economia, a Antropologia, as Ciências Políticas e a Biologia.
Transferências de poder
Na palestra ministrada na ESPCA, Nash descreveu um de seus experimentos recentes. "Em um jogo experimental, os vários jogadores participantes não foram orientados sobre como deveriam reagir ao comportamento daqueles com quem estavam interagindo. A interação foi sendo repetida mais e mais ao longo do jogo até que, naturalmente, os participantes passaram a incentivar o cooperativismo entre si, formando coalizões", disse.
Durante o processo, Nash observou o comportamento dos jogadores quanto às transferências de poder realizadas na formação das coalizões, a aceitação por parte de alguns deles e a distribuição de recompensas por parte dos favorecidos.
"A aceitação dependia das gratificações. E jogadores com forças diferentes poderiam aceitar uma transferência de poder para outro participante, caso fossem recompensados por isso", afirmou.
O experimento permitiu a Nash colocar o processo real de formação de coalizões e seus métodos de aceitação em um modelo matemático, demonstrado pelo cientista no evento.
O trabalho com jogos repetitivos, a formação de coalizões e os métodos de aceitação revelou ainda um aparente paradoxo observado pelo matemático: a evolução natural do comportamento cooperativo mesmo entre organismos ou espécies que interagem apenas por motivações egoístas, fenômeno que tem estudado nos últimos anos.
A exemplo do que ocorreu na concepção do Equilíbrio de Nash, a motivação para as novas pesquisas veio da observação inquieta do mundo.
"A ideia dos métodos de aceitações ocorreu quando eu estava contribuindo com um acampamento científico para jovens, ministrando uma palestra sobre a evolução e como ela naturalmente ocorre em modelos de cooperação entre duas ou mais espécies", contou.
O episódio evidencia o interesse do matemático por novidades, demonstrado também durante o evento. Nash não esteve no local apenas para sua palestra. Ele participou como ouvinte de diversas outras apresentações e acompanhou atentamente a exposição de pôsteres, demonstrando interesse pelo trabalho desenvolvido no Brasil com a Teoria dos Jogos.
"Atualmente, em meus estudos, também tento dar continuidade a uma área mais complexa, que trata de jogos que podem ser parcialmente competitivos e parcialmente colaborativos", disse. "Não estou certo sobre como vão se referir a essa área de pesquisa no futuro, se vão incluí-la na Teoria dos Jogos, se vão dizer que é estatística ou se é econometria. O certo é que há muito a se fazer."
Por: Diego Freire (Agência Fapesp).
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