Desafio em cidades como São Paulo é integrar políticas públicas relacionadas às mudanças climáticas com políticas de moradia e de planejamento urbano, entre outras, dizem cientistas.
Encontrar respostas para essa pergunta é um dos objetivos de uma pesquisa conduzida por cientistas da Universidade de São Paulo (USP) e da University of Michigan (UM), com financiamento da universidade norte-americana em conjunto com a FAPESP.
Segundo as coordenadoras do projeto, as professoras Gabriela Marques Di Giulio, da Faculdade de Saúde Pública da USP, e Maria Carmen Lemos, da School of Natural Resources and Environment da UM, a crescente compreensão de que ações de mitigação não serão suficientes para evitar os impactos climáticos tem levado a um aumento no número de cidades no mundo que apresentam planos de adaptação, reconhecendo os riscos associados às mudanças climáticas e os impactos nos seus sistemas socioecológicos.
Apesar disso, há muitas outras em situação de risco que pouco têm feito. E os motivos são limitações econômicas, institucionais ou políticas, que reduzem a capacidade de prover serviços básicos, infraestrutura e suporte às suas populações.
Di Giulio e Lemos, que apresentaram a pesquisa em 28/03/2016 na FAPESP Week Michigan-Ohio, [que ocorre até 1º de abril] nas cidades de Ann Arbor e Columbus, nos Estados Unidos, apontam que pesquisas têm identificado recursos e estruturas de governança que aumentam as chances de uma adaptação bem-sucedida. E compreender como esses recursos interagem positiva e negativamente é essencial para construir cidades mais resilientes e sustentáveis.
“São Paulo, por exemplo, que é nosso foco de pesquisa, faz parte do C40 Cities Climate Leadership Group [rede de megacidades comprometida com os desafios envolvidos nas mudanças climáticas globais] e é uma das poucas megacidades que contam com uma política municipal sobre mudanças climáticas globais, instituída em 2009, ainda que a maioria dos objetivos não tenha sido atingida”, disse Di Giulio.
Segundo ela, em São Paulo o desafio é integrar políticas públicas relacionadas às mudanças climáticas com políticas de moradia, saneamento, planejamento urbano, gerenciamento de recursos hídricos e mobilidade urbana.
“Trata-se de uma região metropolitana com alta heterogeneidade em termos de acessos a recursos, níveis de pobreza e capacidade de interagir com as mudanças climáticas”, disse.
“Por meio de nossa pesquisa, procuramos entender como uma megacidade, no caso São Paulo, tem se mobilizado para lidar com riscos e ameaças das mudanças climáticas, como os tomadores de decisão em ciência, políticas e sociedade civil percebem os riscos climáticos na esfera local e como fatores contextuais influenciam a capacidade adaptativa local”, disse.
A pesquisa se baseou em métodos qualitativos, que incluem revisão da literatura científica, pesquisa documental – análise de pesquisas de opinião pública, conteúdo jornalístico, documentos e dados socioeconômicos –, entrevistas com atores e grupos sociais e reuniões técnicas e científicas, explicou Di Giulio.
O projeto colaborativo apoiado pela FAPESP e pela UM conta, além de Di Giulio e Lemos, com mais dois pesquisadores no Estado de São Paulo e um em Michigan.
Os pesquisadores já realizaram quatro missões no projeto desde outubro de 2014, que incluíram a realização de um seminário, um workshop e encontros em São Paulo e em Michigan.
Entre os resultados do projeto, Di Giulio mencionou a publicação de artigos como Building adaptive capacity in the megacity of São Paulo, Brazil: urgencies, possibilities and challenges, apresentado em 2015 na RC21 International Conference, International Sociological Association, na Itália, e “Megacidades e mudanças climáticas: um enfoque interdisciplinar sobre o município de São Paulo”, a ser publicado este ano como capítulo de um livro.
Outras cidades brasileiras
“Estamos construindo uma plataforma analítica para entender melhor o processo complexo da adaptação, especialmente se considerarmos as incertezas relacionadas às projeções climáticas de ocorrência e frequência de eventos extremos. Em termos de fatores contextuais que influenciam diretamente a capacidade de adaptação, também analisamos como as restrições econômicas, institucionais e políticas afetam a capacidade das cidades de prover serviços básicos e de apoiar as populações, infraestruturas e ecossistemas atuais”, disse Di Giulio.
Segundo a pesquisa, a população em São Paulo tende a ver as mudanças climáticas como um problema menor. “As pessoas reconhecem os impactos das mudanças climáticas, mas, ainda que preocupadas, para elas esses impactos competem com outros assuntos, que as pressionam mais”, disse Di Giulio.
Os pesquisadores analisaram políticas urbanas recentes em São Paulo, entre as quais intervenções específicas em sistemas de mobilidade, moradia e iniciativas de infraestrutura sustentável, mas consideram que essas e outras medidas não têm sido descritas como ações de adaptação às mudanças climáticas.
O projeto continua com o desenvolvimento do CiAdapta (Cidades, Vulnerabilidade e Mudanças Climáticas), uma abordagem integrada e interdisciplinar para analisar ações e capacidade de adaptação. O novo projeto, com duração até 2017, é financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O CiAdapta envolve seis capitais brasileiras: São Paulo, Manaus, Fortaleza, Vitória, Curitiba e Porto Alegre.
Outro projeto conduzido por Lemos e Di Giulio envolve as cidades do Estado de São Paulo. “Pretendemos desenvolver uma plataforma teórica e metodológica para analisar a adaptação climática aplicável a todas as cidades com população entre 20 mil e 500 mil habitantes. Inicialmente, desenvolvemos um questionário que foi distribuído para essas cidades com a colaboração da Secretaria Estadual do Meio Ambiente”, disse Lemos, que fez a graduação na Universidade Federal de Juiz de Fora e o mestrado e doutorado no Massachusetts Institute of Technology.
“É importante destacar que o que as cidades fizerem agora irá prepará-las para as mudanças climáticas globais e a plataforma que estamos desenvolvendo poderá ajudar nas tomadas de decisões não apenas as cidades contidas na pesquisa, mas também outras cidades no Brasil”, disse a professora da UM.
Por: Heitor Shimizu (Agência Fapesp).
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