Vivemos tempos de mudanças agudas. É preciso preservar os mais pobres e vulneráveis das volatilidades do mercado de trabalho.
Foi durante a Segunda Guerra Mundial que, pela primeira vez, surgiu a prerrogativa de tentar segurar o piloto de um caça ao assento, não só por sua segurança, mas pelo imponderável: a velocidade por vezes o ejetava, e o avião se perdia. Foi daí que surgiu o cinto de segurança, hoje hábito incontestável. O gigantesco hiato temporal entre a criação do equipamento para prender o piloto ao assento e o momento em que nossa convivência com o cinto de segurança passa a ser habitual nos dá a dimensão aproximada das dificuldades para promover mudanças estruturais em hábitos e costumes ou, adaptando o exemplo ao nível empresarial, em formas de gestão e governança.
Incorporar na tomada de decisão de uma empresa aspectos ambientais, impactos sociais, escassez de recursos naturais ou riscos climáticos relacionados direta ou indiretamente ao processo produtivo são rupturas com modelos preestabelecidos de negócios, de investimentos e de desenvolvimento.
Num primeiro momento, a onda ecológica que varreu o mundo levou o setor empresarial a adotar um departamento de sustentabilidade para tratar de seus impactos nesta seara, em geral de forma assistencialista, vertical e impositiva nas contrapartidas oferecidas a comunidades impactadas pelos empreendimentos. Hoje, novos modelos de negócios, como a economia colaborativa, por exemplo, vêm se destacando no ambiente das grandes empresas, vanguardas em suas áreas de atuação. Esta visão sistêmica considera os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU como uma bússola na definição de propósitos e decisão sobre investimentos, por meio de gerenciamento integrado e uma nova governança corporativa.
Uma empresa pronta para o futuro é aquela em que o tema sustentabilidade é integrado e transversal, perpassando todas as áreas: financeira, jurídica, diretoria, RH, chão de fábrica, comunicação e engenharia. Pensar a sustentabilidade do negócio desde o uso do copo plástico até o descarte do dejeto na linha de produção - ou reuso da água, bem como a contratação equilibrada de funcionários, respeitando a igualdade de gênero, raça, faixa etária - é pensar com uma visão sistêmica, integrada e de vanguarda. É pensar em como prender o piloto ao assento, 50 anos antes de essa ação virar hábito comum.
Junto com os principais executivos de suas 60 associadas, o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) vem pensando frequentemente em como fazer frente aos desafios da sustentabilidade. Com a escassez de recursos hídricos e mudanças climáticas afetando projeções de investimentos, prender o piloto ao assento é mais do que uma inovação, instinto de sobrevivência ou segurança. Prender o piloto ao assento é geração de bons negócios e garantia de sobrevivência.
Reproduzir os modelos sistêmicos de sustentabilidade transversal nas cadeias de valores dos mais diversos setores, em todos os segmentos, e com o maior alcance possível, não é somente uma missão diária de empresas. Acreditamos que os políticos têm um papel essencial na condução da articulação dos avanços tecnológicos e das ações de sustentabilidade das empresas e da sociedade, promovendo um ambiente de negócios com marcos regulatórios adequados, fornecendo segurança jurídica e promovendo políticas públicas capazes de dar a escala necessária às boas práticas empresariais.
Vivemos tempos de mudanças agudas. É preciso preservar os mais pobres e vulneráveis das volatilidades do mercado de trabalho, prever as grandes mudanças disruptivas que afetarão setores inteiros da economia, fazer avançar uma agenda focada em inovação e desenvolvimento inclusivo e sustentável e, junto a tudo isso, promover o uso do conceito de sustentabilidade tal qual ocorrido com o cinto de segurança. Como hábito diário, incontestável em âmbito individual, institucional, empresarial, de toda a sociedade. Sem isso, seremos ejetados do planeta Terra.
Por: Marina Grossi (CEBDS).
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